10 discos essenciais - Gal Costa


Por Sidney Falcão

Maria da Graça Costa Penna Burgos nasceu em 26 de setembro de 1945, em Salvador, Bahia. Filha de Maria Costa Penna e de Arnaldo Burgos, Gal Costa foi praticamente criada apenas pela mãe. Seu pai, uma figura pouco presente na vida artista, faleceu quando Gal tinha 14 anos de idade. Ainda muito jovem, Gal começou a trabalhar numa loja de discos, em Salvador. Em 1963, através da sua amiga Dedé Gadelha, Gal conheceu Caetano Veloso. Anos mais tarde, Caetano e Dedé se casariam. Gal começa a sua carreira artística no ano seguinte ao participar do espetáculo Nós Por Exemplo..., no Teatro Vila Velha, em Salvador, ao lado de Caetano, Maria Bethânia, Gilberto Gil e Tom Zé. O grupo apresentou canções próprias e clássicos da música brasileira,tudo sob forte influência da bossa nova.

Em 1965, Gal muda-se para a casa de uma prima no Rio de Janeiro em busca de novas possibilidades na carreira musical. Naquele mesmo ano, assina contrato com a gravadora RCA e lança um compato com duas músicas, "Sim, Foi Você" (de Caetano Veloso) e "Eu Vim da Bahia" (de Gilberto Gil). Gal participa em 1966 do I Festival Internacional da Canção interpretando a canção "Minha Senhora" (de Gilberto Gil e Torquato Neto). Com Caetano Veloso, Gal grava em 1967 o primeiro álbum da carreira de ambos, Domingo, pela gravadora Philips, um trabalho totalmente influenciado pela bossa nova. 

A primeira mudança de orientação artística na carreira de Gal acontece em 1968, quando participa do álbum Tropicália Ou Panis Et Circensis, disco-manifesto lançado pela gravdora Philips e que inaugura o movimento tropicalista, ao lado de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Mutantes, Tom Zé e Nara Leão. Em 1969, através da gravadora Philips, Gal lança o seu primeiro e homônimo álbum solo que emplacou alguns dos seus primeiros sucessos da carreira como "Baby" e "Não Identificado", ambas de Caetano Veloso, e "Que Pena", de Jorge Ben, esta última gravada em dueto com Caetano. Ainda em 1969, sai o segundo álbum solo, Gal, um trabalho radicalmente experimental e totalmente influenciado pelo rock psicodélico. 

Em 1971, Gal Costa parte com a turnê nacional Fatal, que gera o álbum duplo Fa-tal / Gal A Todo Vapor, gravado ao vivo no Teatro Tereza Raquel, no Rio de Janeiro. Foi o primeiro álbum duplo da música brasileira. Gal estoura nas paradas em 1975 com a canção "Modinha Para Gabriela" (de Dorival Caymmi), tema de abertura da novela Gabriela, da TV Globo.  

Com o álbum Gal Tropical, baseado no espetáculo homônimo, Gal Costa dá um nova guinada na carreira que a tornará uma cantora mais popular, ao deixar de vez a imagem de musa tropicalista no passado, passando a adotar um visual mais glamuroso e exuberante, e opta por um repertório mais comercial. Ao longo do próximos anos, Gal se torna uma das maiores vendedoras de discos do Brasil. 

Após 16 anos, Gal deixa a gravadora Philips em 1984 e assina contrato com a RCA. No mesmo ano, lança o álbum Profana que contém sucessos como "Vaca Profana", "Nada Mais" e "Chuva de Prata". O álbum seguinte, Bem Bom, é o auge comercial da discografica de Gal Costa, que embora não seja um trabalho tão aclamado pela crítica, o álbum alcança sucesso comercial vendendo mais de 600 mil, puxado por faixas como "Sorte"e "Um Dia de Domingo" que entram nas paradas de rádio de todo o Brasil. Em 1988, sua versão para "Brasil"(de Cazuza, César Romero e George Israel) foi tema de abertura da novela Vale Tudo, da TV Globo, e se tornou um grande sucesso nacional. 

Na década de 1990, Gal Costa não ficou de fora da moda dos discos em versão acústica que tomou conta da música brasileira entre aquela década e os anos 2000. Em 1997, Gal lançou Acústico MTV: Gal Costa, da série criada pela MTV Brasil, que traz versões acústicas ao vivo dos grandes sucessos da cantora bem como releituras de canções de outros artistas como "Lanterna dos Afogados", dos Paralamas do Sucesso, em que Gal fez dueto com Herbert Vianna, vocalista da banda e autor da canção.

Em 2001, Gal Costa foi incluída no "Hall of Fame" do Carnegie Hall, em Nova York. tornando-se a única cantora brasileira a entrar nessa galeria de homenageads, após participar do show 40 Anos de Bossa Nova em homenagem a Tom Jobim (1927-1997). 

Gal sempre nutriu o desejo de ser mãe, mas o problema nas trompas durante a a adolescência e uma menopausa precoce, a impediram de engravidar. Por isso, em 2007, aos 62 anos, Gal adotou um menino de dois anos, Gabriel. 

O álbum Recanto, lançado em 2011, promove uma nova reorientação musical na carreira de Gal Costa. Produzido por Caetano Veloso e Moreno Veloso, Recanto apresentou uma Gal Costa com quase 70 anos às novas gerações, através de sonoridades mais contemporâneas como a música eletrônica e o trip hop em conexão com a MPB. O álbum não agrada tanto os fãs mais antigos de Gal, mas atrai o público mais jovem, o que deu um novo vigor à carreira de Gal e e renovou o seu público. 

Aos 77 anos, Gal Costa faleceu em 11 de novembro de 2022, em São Paulo, onde passou a morar desde 2014. Segundo sua ssessoria, a cantora faleceu vítima de um infarto. Gal deixou o filho Gabriel Costa Penna Burgos e a companheira Wilma Petrillo, empresária de cantora com quem vivia desde 1998.

Abaixo, seguem dez álbun essenciais que ajudam a compreender a carreira de Gal Costa.


Gal Costa (Philips, 1969). A cantora deste álbum em nada lembra a cantora tímida do álbum Domingo, lançado em parceria com o amigo Caetano Veloso, em 1967. Neste seu primeiro e autointitulado álbum solo, Gal Costa é uma outra artista, transfigurada numa versão tropicalista de Janis Joplin. O álbum mostra uma Gal mais diversificada, indo do romantismo pop psicodélico (“Não Identificado”) ao soul (“Se Você Pensa”), passando pelo rock (“Divino Maravilhoso”) e pela bossa-pop (“Baby”). Gal radicalizaria mais ainda na transgressão tropicalista no álbum seguinte, o lisérgico Gal, lançado no mesmo ano de 1969. 



Gal (Philips, 1969). Gal é o álbum mais transgressor que Gal Costa já gravou em toda a sua carreira. A capa é completamente psicodélica e dá ao ouvinte as pistas do conteúdo do álbum. Gal Costa está com os dois pés fincados na psicodelia. Em algumas faixas, a cantora baiana canta totalmente influenciada por Janis Joplin, carregada de muita fúria e rebeldia. Sem o apelo comercial do álbum anterior e bem mais experimental, Gal, o álbum, tem como hit apenas "Meu Nome É Gal", composto por Roberto e Erasmo Carlos especialmente para Gal Costa. As guitarras derramadas de distorção e cheias de efeitos dos pedais wah-wah do genial guitarrista Lanny Gordin, dão um toque "hendrixiano" ao disco, e em alguns momentos, duela com a voz aguda e enraivecida de Gal.


Fa-tal: A Todo Vapor (Philips, 1971). O show de Gal Costa no Teatro Tereza Rachel, no Rio de Janeiro, em outubro de 1971, foi gravado ao vivo e rendeu este álbum duplo, que diga-se de passagem, foi o primeiro álbum duplo da música brasileira. Apesar da gravação de baixa qualidade, Fa-tal: A Todo Vapor foi um marco na carreira de Gal Costa e retrata muito bem a fase do chamado "desbunde" da cantora naquele começo dos anos 1970, quando Gal virou "musa hippie", defendendo o aqu no Brasil o legado tropicalista, enquanto Caetano Veloso e Gilberto Gil estavam exilados na Inglaterra por causa da ditadura militar. No repertório do álbum, há versões espetaculares de Gal para "Como Dois E Dois" (de Caetano), "Sua Estupidez" (de Roberto e Erasmo Carlos) e "Assum Preto"(de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira). Destaque para a então inédita "Pérola Negra", canção de Luiz Melodia (1951-2017) que na época era um "ilustre" desconhecido.


Índia (Philips, 1973). Quarto álbum solo de Gal Costa, Índia causou polêmica quando foi lançado por causa da sua capa, que mostra a imagem fechada de Gal usando uma tanga vermelha com uma saia indígena e as coxas da cantora à mostra. Os censores da ditadura militar vetaram na época a capa, e a gravadora teve que vender o álbum envolvido numa embalagem plástica de cor escura. Tal medida não impediu que o público desfrutasse do seu conteúdo, que traz uma releitura bem pessoal de Gal para "Índia", um clássico da música caipira , originalmente gravada pela dupla Cascatinha & Inhana, nos anos 1950. Há também uma Gal cantando as dores do amor em "Volta" (de Lupicínio Rodrigues) e a sofisticação da bossa nova em "Desafinado" (de Tom Jobim e Newton Mendonça), passando pela poesia concreta através de "Relance" (de Caetano Veloso) e "Pontos de Luz"(Wally Salomão e Jards Macalé).


Água Viva (Philips, 1978). Através deste álbum, Gal Costa deu início a um processo de mudança na sua orientação musical e estética, que pôs fim à fase da musa tropicalista e deu início à fase da cantora de massa e grande vendedora de discos que ela viria a se transformar. Com mais de 100 mil cópias vendidas, Água Viva traz canções que se tornaram grandes sucessos da carreira de Gal como "Folhetim" (de Chico Buarque), "Paula e Bebeto" (de Caetano e Milton Nascimento), "Pois É" (de Tom Zé e Chico Buarque) e "Mãe" (de Caetano), uma das mais belas e emocionantes canções sobre mãe na música brasileira.



Gal Tropical (Philips, 1979). Este álbum consolida a nova Gal Costa que já se prenunciava em Água Viva. Gal Tropical deixa para trás a Gal "musa hippie" e traz uma nova Gal, embrulhada num visual mais glamuroso e exuberante. O álbum foi baseado no espetáculo de mesmo nome que foi um sucesso de público e de crítica, e que resgatou canções da "época de ouro" do rádio brasileiro, entre os anos 1930 e 1940, como "Noites Cariocas"(de Hermínio Bello de Carvalho e Jacob do Bandolim), "Balancê"(de João de Barro e Alberto Ribeiro) e "Samba Rasgado"(de Portello Juno e Wilson Falcão). Mas o álbum contém canções mais contemporâneas à época de seu lançamento como "Força Estranha"(de Caetano Veloso), "Olha"(de Roberto Carlos e Erasmo Carlos), "Juventude Transviada" ( de Luiz Melodia). Para este álbum, Gal regravou canções gravadas antes por ela mesma como "Índia" (José Asunción Flores e Manuel Ortiz Guerrero; versão: José Fortuna)  e "Meu Nome É Gal" (de Roberto Carlos e Erasmo Carlos), que nesta segunda versão traz um duelo sensacional entre a voz aguda de Gal e a guitarra e Robertinho de Recife. O sucesso comercial de Gal Tropical elevou o status de Gal para "diva da MPB" e abriu uma sequência de álbuns que alcançaram elevados índices de vendas, pondo a cantora baiana na galeria dos artistas campeões em vendas de discos no Brasil. 


Fantasia (Philips, 1981). Mais um álbum que nasceu de um espetáculo, que embora tenha sido sucesso de público, sofreu críticas da imprensa musical. Porém, essa mesma imprensa elogiou o álbum que além de ter sido sucesso de crítica, foi um grande sucesso comercial, alcançando a marca de 500 mil cópias vendidas. O êxito comercial de Fantasia  é compreensível, afinal, o álbum contém canções foram sucesso nas paradas de rádio como "Festa do Interior"(de Moraes Moreira e Abel Silva), "Meu Bem, Meu Mal" (De Caetano Veloso), "Canta Brasil"( de David Nasser e Alcir Pires Vermelho), "Faltando Um Pedaço" e "Açaí", as duas últimas compostas por Djavan. 



Profana (RCA, 1984). Após 16 anos na Philips, Gal Costa trocou de gravadora e assinou contrato com a RCA. Profana marcou a estreia de Gal na companhia, e que apesar da troca de gravadora, manteve o bom desempenho comercial e a diversidade musical dos álbuns anteriores. O rock "Vaca Profana" (de Caetano Veloso), é uma crítica à hipocrisia e ao falso moralismo, enquanto que a carnavalesca "Onde Está O Dinheiro" ( de José Maria de Abreu, Francisco Mattoso e Paulo Barbosa) parece ser uma sutil indireta aos políticos corruptos. O romantismo está bem representado no "açucarado" bolero pop "Chuva de Prata" (de Ed Wilson e Ronaldo Bastos) e em "Nada Mais", versão em português de "Lately", de Stevie Wonder, em que Gal Costa canta de maneira sublime. Destaque para a o forró "Cabeça Feita" que é dividido em três partes, intituladas "Cabeça Feita"(de Jackson do Pandeiro e Sebastião Batista da Silva), "Tililingo" (de almira Castilho) e "Tem Pouca Diferença"(de Durval Vieira), esta última com participação especial de Luiz Gonzaga (1912-1989). 


Bem Bom (RCA, 1985). Este álbum marca o ápice da fase comercial de Gal Costa iniciada com Gal Tropical em 1979. A capa traz Gal Costa discretamente sensual aos 40 anos de idade. Apesar da produção bem moderna para a época, Bem Bom não teve recepção modesta da crítica. Mas as mais de 600 mil cópias vendidas comprovam que o álbum agradou o público, graças a faixas com "Sorte" (de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos) onde Gal faz dueto com Caetano Veloso, "Musa de Qualquer Estação"( de Roberto e Erasmo Carlos) e "Um Dia de Domingo" (de Michael Sullivan e Paulo Massadas) dueto de Gal com Tim Maia que fez um enorme sucesso radifônico no Brasil. O disco contém ainda releituras de Gal para "Todo Amor Que Houver Nessa Vida" (de Cazuza e Frejat). 


Recanto (Universal Music, 2011). Após seis anos sem lançar um álbum de inéditas, Gal Costa surpreendeu a tudo e a todos com Recanto, álbum que promove uma nova reorientação musical na carreira cantora baiana. Produzido por Caetano Veloso e Moreno Veloso, e com todas as onze canções compostas por Caetano, Recanto é um trabalho em que Gal flerta com a música eletrônica,  como na faixa "Neguinho", recheada de programações eletrônicas e sintetizadores e em "Miami Maculelê", um misto de percussão afrobaiana com batidas de funk carioca com "pinceladas" de ruídos eletrônicos. Mas o disco reserva espaço para coisas mais convencionais como o blues rock minimalista "Cara do Mundo" e para uma canção cheia de cordas como "Segunda", que destoa completamente do repertório do disco. 


"Divino Maravilhoso" 
(4º Festival da Record, 1968, video parcial)

"Volta" (programa de TV, ao vivo, 1973)

"Paula e Bebeto" 
("Especial Mulher 80",TV Globo,1980)

"Balancê" 
(videoclipe,"Fantástico",
TV Globo,1979)

"Força Estranhar" (ao vivo, 
Montreux Jazz Festival, 1980)

"Chuva de Prata" (videoclipe, 
"Fantástico", TV Globo, 1984)

"Festa do Interior" (ao vivo, 
Montreux Jazz Festival, 1985)

"Vaca Profana" ("Gal Costa Especial", 
TV Manchete, 1985)

"Sorte" ("Especial 
Chico & Caetano, 
TV Globo, 1986)

"Neguinho" (ao vivo, 2013)





Comentários

  1. Ótima lista! Continue fazendo esses posts

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  2. O álbum ao vivo de 1971 vale pelo repertório,a performance da cantora é sofrível,a não ser quando ela cantou sentada,o diafragma ajuda,rs.

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  3. ''Gal Tropical'' e o ''Fantasia'' não podiam ficar fora,são excelentes,guardo os dois LPs até hoje.

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  4. Os cantores de MPB nunca foram grandes vendedores de discos,na verdade vendiam pouco,a música de qualidade é pra poucos.

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