“Marquee Moon” (Elektra, 1977), Television

Por Sidney Falcão

Na primeira metade dos anos 1970, o cenário alternativo de rock em Nova York fervilhava e tinha como ponto central um bar conhecido como CBGB. Era lá que dezenas de cantores e bandas alternativas se apresentavam trazendo novidades musicais e estéticas que moldariam o que seriam conhecidos pouco depois como punk e new wave. Artistas como Ramones, Blondie, Patti Smith, Talking Heads, The Dead Boys, The Misfits entre outros, fizeram as suas primeiras apresentações no CBGB.

A história da banda Television começa a partir de uma outra banda, a Neon Boys, um trio formado em 1972, em Nova York, e que tinha na sua formação Tom Verlaine (voz e guitarra), Richard Hell (baixo) e Billy Ficca (bateria). Um ano depois, com a entrada de um segundo guitarrista, Richard Lloyd, a banda vira um quarteto e troca o nome para Television. No combo de influências da nova estavam The Doors, The Stooges, Velvet Underground e jazz.

Depois de vários ensaios, o quarteto faz a sua primeira apresentação em março de 1974, no Towhouse Theatre, em Nova York. No mesmo mês, a banda se apresentou pela primeira vez no bar CBGB, um lugar que até então era frequentado pelo público fã de música country. A Television se torna a primeira banda de rock a se apresentar no CBGB, arrastando outras bandas e cantores de rock para aquele lugar. Em pouco tempo, o CBGB acabaria se tornando o ponto central na cena alternativa de rock em Nova York, e o primeiro palco para bandas e artistas em início de carreira e que marcariam a história do rock como Ramones, Blondie, Patti Smiths, Talking Heads, The Dead Boys, The Misfits entre outros. Foi desse “caldo” roqueiro que saiu as diretrizes que moldariam a sonoridade e a estética do que conheceríamos pouco depois como punk e new wave. E a Television foi quem ligou a chave e deu a partida.

Em janeiro de 1975, as divergências com Tom Verlaine fizeram Richard Hell deixar a banda e partir para outros projetos, como a The Heartbreakers (que ele formou com Johnny Thunders, ex-New York Dools) e depois a banda Richard Hell & The Voidoids. A vaga de Hell na Televison foi ocupada por Fred Smith (ex-Blondie). Com a nova formação, a banda lança em outubro de 1975, primeiro single com as canções “Little Johnny Jewel, Part One” e “Little Johnny Jewel, Part Two”, através do selo Ork Records.

Apresentação da banda Television no CBGB, Nova York, em junho de 1974. O grupo
ainda contava com Richard Hell (o primeiro à esquerda) na sua formação.

Em agosto, de 1976, a banda assina contrato com a gravadora Elektra, e no mês seguinte, começaram as gravações do primeiro álbum no estúdio A&R, em Nova York. A produção ficou a cargo de Andy Johns, profissional experiente que já havia trabalhado em estúdio de gravação como engenheiro de som para bandas consagradas como Rolling Stones, Free, Humble Pie, Jethro Tull e Led Zeppelin.

Intitulado Marquee Moon, o álbum de estreia da Television foi lançado em 8 de fevereiro de 1977. Marquee Moon é erroneamente classificado como um álbum de “punk rock”, muito embora, na prática, a sonoridade da banda não possua características de punk rock. Ao contrário, a sonoridade da Televison se contrapõe à crueza do punk, e se inclina para referências de jazz e o emprego de guitarras melódicas. As guitarras de Verlaine e Lloyd dialogam muito bem entre si, alternando bases rítmicas, ruídos e riffs, e criam melodias agradáveis, que em alguns momentos, contrastam com a voz “chorosa” de Tom Verlaine. O álbum traz, por exemplo, uma faixa de dez minutos, algo que foge das convenções do punk rock que pregam um tempo curto para as canções.

Tom Verlaine o autor de todas as letras das canções de Marquee Moon, que começa com “See No Evil”, um rock com influências de Stooges e que parece tratar sobre egocentrismo. Os primeiros versos são bem curiosos: “O que eu quero / Eu quero agora / E isto é muito mais / Do que de qualquer maneira”. A segunda faixa, “Venus”, tem fraseados agradáveis de guitarra, e é uma canção que faz lembrar Lou Reed (1942-2013), fase Transformer, álbum de 1972. “Friction” tem como destaque uma linha de baixo robusta e pulsante. O lado 1 do álbum encerra com a faixa-título e seus pouco mais de dez minutos de duração, onde há uma boa interação das guitarras de Tom Verlaine e Richard Lloyd.

Television, no CBGB, fevereiro de 1977. Da esquerda para a direita:
Tom Verlaine, Fred Smith, Billy Ficca e Richard Lloyd.

“Elevation” abre o lado 2 do álbum, uma canção que traz belos solos de guitarra de Richard Lloyd. “Guiding Light” é a única balada presente no álbum, e também a única em que Verlaine divide parceria com Richard Lloyd. Nesta canção, além de cantar e tocar guitarra, Tom Verlaine toca também teclados, fazendo um som discreto, apenas para “forrar” o fundo musical da canção. Em “Prove It”, a Television casa referências de rock’n’roll dos anos 1950 com referências do rock contemporâneo. O álbum termina com “Torn Curtain”, música que começa com um rufar de tambor e prossegue num andamento arrastado e melancólico.

A recepção de Marquee Moon por parte do público foi fraca. Por outro lado, o álbum foi aclamado pela crítica, como por exemplo, pelo jornalista Nick Kent, crítico musical da NME.

Em abril de 1978, a Television lançou o segundo álbum, Adventure, um disco com um apelo um pouco mais comercial, mas que não teve a mesma repercussão de Marquee Moon perante a crítica especializada. Pouco depois de ter lançado Adventure, a Television encerrou suas atividades, motivada pelas divergências artísticas entre os integrantes da banda e o abuso de drogas de Richard Lloyd.

A Television retornou em 1992, e lançou um novo e homônimo álbum, mas sem grandes repercussões. Desde então, a banda fez apresentações esporádicas ao redor do mundo.

Embora não tenha alcançado sucesso comercial, Marquee Moon influenciou ao longo do tempo gerações de bandas como Sonic Youth, The Strokes, Franz Ferdinand, Muse e Arctic Monkeys. Marquee Moon é considerado um disco revolucionário e que frequentemente é incluído nas listas de melhores álbuns de todos os tempos.

Faixas

Todas as faixas compostas por Tom Verlaine, exceto onde está indicado.

Lado 1