Toys In The Attic (Columbia Records, 1975), Aerosmith

Por Sidney Falcão

Em 1975, o Aerosmith ainda buscava firmar seu espaço no rock. Depois de um disco de estreia promissor e do sólido Get Your Wings (1974), a banda começava a encontrar sua identidade sonora, um equilíbrio entre o peso do hard rock e a malícia do blues. Toys in the Attic, seu terceiro álbum, foi o passo definitivo nessa evolução, um trabalho que capturou a energia crua dos palcos e a refinou em estúdio. 

Com produção de Jack Douglas, o disco trouxe um Aerosmith mais coeso e ambicioso, criando faixas que aliavam riffs cortantes, groove irresistível e letras que destilavam rebeldia. O resultado foi um sucesso avassalador: impulsionado por hinos como "Sweet Emotion" e "Walk This Way", o álbum catapultou a banda ao estrelato. Quase cinco décadas depois, Toys in the Attic segue como referência no hard rock, um marco definitivo que moldou o som da década e influenciou gerações. 

Em Toys in the Attic, o Aerosmith consolidou sua identidade sonora e elevou seu nível como compositores. Se nos discos anteriores a banda já demonstrava talento, aqui o grupo atingiu um novo patamar, explorando arranjos mais sofisticados e estruturas musicais mais dinâmicas. Parte desse salto se deve à parceria com o produtor Jack Douglas, que não apenas refinou o som do quinteto, mas também teve um papel ativo no desenvolvimento das faixas. 

O processo criativo foi marcado pela espontaneidade. Muitas ideias surgiram no próprio estúdio, com os integrantes improvisando até encontrar a fórmula certa para cada música. Essa abordagem garantiu uma sonoridade vibrante e diversa, indo além do hard rock convencional. O álbum incorpora influências de blues, R&B e até jazz, criando momentos de grande riqueza musical. Faixas como "Big Ten Inch Record" e "Walk This Way" evidenciam essa versatilidade, provando que o Aerosmith não tinha medo de ousar. 

Aerosmith em 1975, da esquerda para a direita: Joe Perry, Steven Tyler, Tom Hamilton,
Brad Whitford, Joey Kramer.

Gravado no icônico Record Plant, em Nova York, Toys in the Attic marcou um avanço significativo na sonoridade do Aerosmith. Sob a supervisão de Jack Douglas, a banda experimentou novas possibilidades técnicas sem perder a energia crua que a definia. O produtor soube canalizar a intensidade dos músicos, garantindo um som encorpado e mais refinado que nos álbuns anteriores. 

Uma das grandes inovações foi o uso de instrumentos pouco convencionais no hard rock da época. Em “Sweet Emotion”, por exemplo, Tom Hamilton gravou a icônica introdução com um baixo filtrado por um pedal de talkbox, enquanto marimbas adicionavam uma textura etérea à faixa. O resultado foi um dos momentos mais marcantes do disco. 

A abordagem do Aerosmith no estúdio priorizou a espontaneidade. Muitas gravações foram feitas ao vivo, capturando a química entre os integrantes. Além disso, músicos adicionais contribuíram para expandir o espectro sonoro do álbum, com arranjos que iam do rock visceral ao blues sofisticado. Essa combinação de agressividade e experimentação fez de Toys in the Attic um dos discos mais inventivos da década, elevando o Aerosmith ao panteão do rock setentista. 

Toys in the Attic, é um marco na carreira do Aerosmith, um álbum que mistura a energia selvagem do hard rock com uma leveza experimental, mostrando a versatilidade de uma banda no auge da sua criatividade. As faixas deste disco são um reflexo da juventude excessiva e do espírito aventureiro da época, trazendo à tona tanto a força do rock quanto momentos de introspecção que antecipam algumas das grandes baladas da banda. A seguir, uma análise detalhada de cada faixa, com foco no seu impacto histórico e na inovação sonora que caracteriza este clássico. 

Sessão de gravação do álbum Toys in the Attic, em 1975. Da esquerda para a direita:
o produtor Jack Douglas, 
engenheiro de som Jay Messina 
e o guitarrista Joe Perry.


A abertura do álbum, Toys in the Attic, não poderia ser mais contundente. Com um riff impetuoso e um ritmo acelerado, a música captura o Aerosmith em sua forma mais crua e energética. A guitarra de Joe Perry, juntamente com o baixo pulsante de Tom Hamilton e a bateria de Joey Kramer, cria um turbilhão de som, enquanto Steven Tyler impõe sua voz áspera, dando vida a uma letra que brinca com a metáfora da insanidade. “Toys in the attic”, faixa que dá nome ao disco, faz referência a um estado mental perturbado, e a canção encapsula esse tema com uma sonoridade que mistura agressividade e melodia de forma magistral, estabelecendo o tom para o que viria a seguir. 

Seguindo com “Uncle Salty”, a banda mergulha em um território mais sombrio e introspectivo. O riff suave e a linha de baixo envolvente criam um ambiente melancólico, enquanto as guitarras de Perry e Brad Whitford trazem uma textura psicodélica, evocando a sonoridade dos Beatles na sua fase mais experimental. A letra de Tyler, que conta uma história de abuso e abandono com a figura do tio enigmático, oferece uma reflexão profunda sobre as mazelas da vida, equilibrando o trágico com uma aura de mistério. A alternância entre os versos mais suaves e os refrões mais intensos reforça o impacto emocional da música. 

Em “Adam’s Apple”, o Aerosmith retoma a irreverência e o groove com um som mais dançante. A guitarra de Perry e a voz de Tyler conferem uma aura provocadora à música, enquanto a letra faz uma reinterpretação sarcástica da história de Adão e Eva. A música flui com um balanço contagiante e uma carga sexual subentendida, caracterizando o que seria a essência do Aerosmith: um rock cheio de atitude e humor, mas com a habilidade de se manter provocador e afiado. 

Com “Walk This Way”, o Aerosmith cria um dos seus maiores sucessos, uma faixa que atravessa gerações. O riff icônico de Perry, a bateria vibrante de Kramer e a linha de baixo pulsante são imbatíveis, formando uma base sólida para a performance vocal de Tyler, que entrega um dos seus melhores momentos com seu estilo acelerado e quase spoken word. A letra, com sua carga de humor e insinuação sexual, criou uma ponte entre o rock e outros gêneros, como o rap, que seria mais tarde explorado na famosa colaboração com o Run-D.M.C. 

Foto do Aerosmith para a contracapa de Toys in the Attic.

“Sweet Emotion” é, sem dúvida, um dos maiores hinos da banda e um marco no hard rock. Com seu baixo inconfundível e o uso de talk-box na guitarra, a faixa cria uma atmosfera hipnótica que explode no refrão. A tensão crescente ao longo da música reflete as relações internas da banda, especialmente o desgaste emocional de Tyler e Perry. A música é uma poderosa combinação de introspecção e explosão sonora, encapsulando as complexidades de uma vida em turnê e os altos e baixos da fama.

“No More No More” traz uma vibe mais descontraída, com um riff cativante e uma linha de piano que adiciona uma sensação de groove e diversão. A letra, que descreve os desafios e os excessos da vida na estrada, oferece uma visão quase autobiográfica da experiência de uma banda em ascensão. Com uma pegada que lembra os Rolling Stones, a faixa traz leveza e irreverência, mas sem perder a profundidade característica do Aerosmith. 

"Round and Round" é a faixa mais pesada do álbum, com um riff de guitarra que evoca uma sensação de destruição iminente. A música traz um tom sombrio, com uma bateria sólida e guitarras densas, criando uma atmosfera de tensão. A letra, com seu tom apocalíptico, explora temas de futilidade e caos, oferecendo uma reflexão profunda sobre a violência e o desespero que permeiam a vida. 

Por fim, fechando o álbum, “You See Me Crying”, uma linda balada carregada de emoção e uma produção orquestral marcante. A performance vocal de Steven Tyler é de tirar o fôlego, e a combinação de piano, cordas e a entrega visceral da letra faz dessa música um dos momentos mais intensos da carreira da banda. A faixa é um lamento de amor perdido e desgosto, encerrando Toys in the Attic de forma arrebatadora, com uma carga emocional que contrasta com o resto do álbum, oferecendo uma pausa introspectiva no meio da energia avassaladora das outras faixas. 

Lançado em 8 de abril de 1975, Toys in the Attic marcou o momento em que o Aerosmith deixou de ser uma promessa para se tornar uma potência do hard rock. O álbum foi um sucesso comercial, impulsionado pelo impacto de “Sweet Emotion” e “Walk This Way”, que se tornaram hinos do gênero. A crítica, inicialmente dividida, logo reconheceu a energia bruta e a sofisticação do disco. 

Toys in the Attic  alcançou o 11º lugar na parada Billboard 200 dos EUA. O single de "Sweet Emotion" se tornou um modesto sucesso na Billboard Hot 100, alcançando a 36º lugar em 1975, e "Walk This Way" alcançou o 10º lugar na Hot 100 em 1977. Não demorou muito, e  Toys in the Attic  alcançou a marca de 8 milhões de cópias vendidas nos Estados Unidos. 

Além de consolidar o Aerosmith como um dos grandes nomes do rock dos anos 1970, Toys in the Attic também redefiniu os limites do hard rock com sua mistura de peso, groove e irreverência. O álbum catapultou a banda para o estrelato, garantindo seu espaço entre os gigantes do gênero. Décadas depois, sua influência ainda reverbera, inspirando gerações de músicos e mantendo-se como referência obrigatória. Clássico absoluto Toys in the Attic  não é apenas um disco marcante da discografia do Aerosmith, mas um dos pilares fundamentais da história do rock.

 

Faixas

Lado 1

1."Toys in the Attic" ( Joe Perry e Steven Tyler)        

2."Uncle Salty" (Tom Hamilton e Tyler)         

3."Adam's Apple" (Tyler)        

4."Walk This Way" (Perry e Tyler)

5."Big Ten Inch Record"  (Fred Weismantel)

 

Lado 2

1."Sweet Emotion" (Hamilton e Tyler)           

2."No More No More"  (Perry e Tyler)           

3."Round and Round" (Tyler e Brad Whitford)          

4."You See Me Crying" (Darren Solomon e Tyler)

 

Aerosmith:

Tom Hamilton (baixo, guitarra rítmica)

Joey Kramer (percussão, bateria, vocais)

Joe Perry (guitarra acústica, baixo, guitarra, percussão, guitarra rítmica, vocais, backing vocals, slide guitar)

Steven Tyler (baixo, gaita, percussão, teclado, vocais)

Brad Whitford (guitarra, guitarra rítmica)


Ouça na íntegra o álbum Toys In The Attic


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