“Minute by Minute” (Warner, 1978), The Doobie Brothers

Por Sidney Falcão

Quando Minute by Minute chegou às lojas, em dezembro de 1978, o The Doobie Brothers já havia passado por uma transformação significativa. A banda, antes conhecida por seu rock guiado por guitarras, adotava agora um pop-soul mais refinado e elegante. Essa guinada foi resultado direto da entrada de Michael McDonald em 1975, cuja voz encorpada e cheia de alma, aliada ao seu estilo sofisticado nos teclados, redefiniu o som do grupo após a saída de Tom Johnston, cofundador da banda. O oitavo álbum de estúdio dos Doobies representa o ápice da era McDonald, mesclando com precisão as raízes roqueiras do passado com o soft rock, jazz e R&B que ele trouxe ao repertório.

Minute by Minute não foi apenas mais um álbum na carreira dos Doobie Brothers — foi um marco transformador. Com a saída de Tom Johnston, que comandava a banda na era de seus hinos rock como “China Grove” e “Listen to the Music,” Michael McDonald assumiu o leme criativo. Johnston, afastado por problemas de saúde, deixou espaço para McDonald impor sua marca: teclados envolventes, vocais sofisticados e um flerte inegável com o soul. Embora essa guinada tenha dividido opiniões entre os fãs mais antigos, Minute by Minute simboliza o momento em que os Doobies abraçaram uma nova identidade sonora e alcançaram um público renovado.

Se há um motivo para Minute by Minute ser lembrado, é sua alquimia impecável de pop, soul e jazz, que se tornou a assinatura do chamado yacht rock. O termo, popularizado nos anos 2000, refere-se a um subgênero do soft rock dos anos 1970 e início dos 1980, caracterizado por arranjos sofisticados, produção polida e letras frequentemente voltadas para temas de romance e estilo de vida. Enquanto o soft rock abrange uma sonoridade mais ampla e simples, incluindo baladas acústicas e melodias acessíveis, o yacht rock foca em grooves elegantes, influências do R&B e do jazz, além de um apelo mais urbano e luxuoso — representado com perfeição neste álbum dos Doobie Brothers.

A voz de Michael McDonald, carregada de emoção, domina cada faixa, enquanto seus teclados dão ao som da banda uma sofisticação única. Sob a produção refinada de Ted Templeman, o álbum ganha uma base suave que sustenta os grooves elegantes dessa nova fase dos Doobies. Nas letras, Minute by Minute passeia por temas como amor, desilusões e reflexões, unindo acessibilidade pop a uma profundidade emocional que ainda ressoa com o público.

"Here to Love You" dá início ao álbum com uma vibrante declaração de amor. A fusão de rock e funk é conduzida pelos teclados, com o piano elétrico fornecendo uma base rítmica sólida e envolvente. A canção evoca um clima caloroso e otimista, com a letra exaltando o compromisso e a devoção como alicerces de um relacionamento genuíno. A metáfora do amor como um porto seguro contrasta com o ritmo contagiante e dançante do arranjo.

Já "What a Fool Believes", a joia da coroa do álbum, apresenta um retrato melancólico de um homem preso a memórias de um romance que talvez nunca tenha sido real. A faixa equilibra perfeitamente soft rock, pop e R&B, criando uma atmosfera delicadamente hipnótica. Os sintetizadores enriquecem a textura sonora, amplificando a nostalgia com um toque quase onírico.

The Doobie Brothers. Em pé:. LR Tiran Porter, Jeff 'Skunk' Baxter, Michael McDonald,
Keith Knudsen e John Hartman. Sentado: Patrick Simmons.

Com a faixa-título, “Minute by Minute”, os Doobie Brothers mergulham na introspecção, abordando a dor de um término amoroso e a esperança de uma possível reconciliação. A fusão de pop melódico com toques de soul é conduzida pelo piano elétrico, que sustenta o ritmo moderado e amplifica a carga emocional. A metáfora do tempo como um aliado frágil na superação da perda dá à faixa um lirismo universal e atemporal.

"Dependin' on You" quebra o tom melancólico com uma vibração mais otimista. A música celebra o apoio mútuo em um relacionamento, unindo rock animado e harmonias vocais impecáveis. A guitarra assume o protagonismo, tecendo riffs que conectam a mensagem positiva à sonoridade vibrante. A interdependência, tema central da letra, é traduzida na sintonia entre os músicos, resultando em uma faixa cativante e coesa.

Em "Don't Stop to Watch the Wheels", o álbum adota uma postura motivacional, incentivando o ouvinte a avançar sem olhar para trás. A batida vibrante do rock, combinada com um ritmo acelerado, evoca uma sensação de movimento contínuo, enquanto a percussão acrescenta camadas que reforçam a energia otimista da faixa. A metáfora das "rodas" como símbolos do fluxo da vida ressalta a urgência de seguir em frente.

"Open Your Eyes" oferece uma pausa introspectiva, convidando o ouvinte a refletir sobre suas relações e a buscar uma maior autoconsciência. Com arranjos guiados por um violão delicado, a simplicidade instrumental serve como um contraste eficaz à profundidade lírica. A faixa cria uma atmosfera íntima que estimula a introspecção e o crescimento emocional.

Patrick Simmons divide os vocais com Nicolette Larson (1952-1997) em "Sweet Feelin'", uma celebração ao calor e à intensidade do amor. A mistura de soft rock com toques de soul ganha ainda mais charme com a presença do saxofone, que injeta uma sofisticação romântica à faixa. A letra recorre a imagens sensoriais para traduzir a força do afeto, enquanto a melodia acolhedora evoca momentos de conexão genuína e felicidade compartilhada.

"Steamer Lane Breakdown" é um espetáculo instrumental que exibe a maestria técnica da banda. Inspirada no bluegrass, a faixa coloca o banjo e o violão em destaque, criando uma conversa musical cheia de energia. Esse momento é uma prova vibrante da versatilidade do grupo, explorando novos territórios sonoros com criatividade e entusiasmo.

Com "You Never Change", o álbum adota um tom mais ácido, explorando a frustração gerada pela falta de evolução de alguém. O rock pulsante é impulsionado por riffs marcantes de guitarra elétrica, que refletem a tensão emocional embutida na narrativa. A música destaca o contraste entre o ideal e a realidade das relações humanas, carregada de uma energia crua.

The Doobie Brothers ao vivo em Amsterdã, Holanda, em 1978, mesmo ano
de lançamento do álbum Minute by Minute.

"How Do the Fools Survive?" fecha o disco com uma poderosa balada soul, repleta de lirismo e introspecção. O piano conduz a faixa com um toque grave e emocional, enquanto a letra, repleta de metáforas, retrata a vida como um campo de batalha, sugerindo resiliência e esperança diante das adversidades.

Minute by Minute consolidou os Doobie Brothers no topo das paradas, conquistando o primeiro lugar na Billboard 200 e mantendo-se lá por cinco semanas consecutivas. O sucesso foi impulsionado pelo hit "What a Fool Believes", que se tornou um hino do soft rock dos anos 1970. A faixa principal não apenas conquistou o público, mas também impulsionou as vendas do álbum a níveis impressionantes, resultando em triplo disco de platina e mais de 3 milhões de cópias vendidas nos Estados Unidos.

A crítica, no entanto, ficou dividida: enquanto alguns elogiaram o refinamento musical e a sofisticação dos arranjos, outros lamentaram a mudança de direção, distante do rock cru das origens da banda. Ainda assim, o reconhecimento foi inquestionável. No Grammy Awards de 1980, "What a Fool Believes" faturou “Canção do Ano” e “Gravação do Ano”, enquanto a faixa-título levou o prêmio de “Melhor Performance Vocal Pop por um Duo ou Grupo”.

O sucesso avassalador de Minute by Minute não impediu que tensões internas surgissem nos bastidores. A liderança musical de Michael McDonald, fundamental para a transformação sonora e o triunfo comercial da banda, gerou atritos crescentes, especialmente com o guitarrista Jeff "Skunk" Baxter. Enquanto McDonald buscava um som mais refinado, misturando pop, rock e R&B, Baxter insistia em arranjos de guitarra ousados, com uma pegada experimental que destoava da nova direção.

As divergências chegaram ao ápice no início de 1979, resultando na saída de Baxter e do baterista John Hartman (1950-2021). Ambos foram substituídos por John McFee e Chet McCracken (1946-2022), marcando o início de uma nova fase para os Doobie Brothers. O álbum, assim, não apenas representou o auge comercial da banda, mas também um momento decisivo que redefiniria sua formação e identidade musical nos anos seguintes.

Minute by Minute consolidou-se como um marco no yacht rock, com seus vocais aveludados, produção impecável e arranjos refinados. Embora alguns admiradores do som mais roqueiro dos primeiros anos do The Doobie Brothers ainda o vejam como um desvio, sua influência no soft rock e no pop é inquestionável. Canções como "What a Fool Believes" se tornaram clássicos, e até críticos inicialmente céticos acabaram reconhecendo o álbum como um triunfo. Ele é, acima de tudo, uma prova da reinvenção da banda e do sucesso em abraçar novos horizontes musicais.

Faixas

Lado 1

"Here to Love You" (McDonald)
"What a Fool Believes" (McDonald, Kenny Loggins)
"Minute by Minute" (McDonald, Lester Abrams)
"Dependin' on You" (Simmons, McDonald) - Nicolette Larson (vocais de apoio)
"Don't Stop to Watch the Wheels" (Simmons, Baxter, Michael Ebert)

Lado 2

"Open Your Eyes" (McDonald, Abrams, Henderson)
"Sweet Feelin'" (Simmons, Templeman) – participação especial: Nicolette Larson
"Steamer Lane Breakdown" (Simmons)
"You Never Change" (Simmons)
"How Do the Fools Survive?" (McDonald, Carole Bayer Sager)

The Doobie Brothers: Patrick Simmons (guitarra, vocais principais e de apoio), Jeff "Skunk" Baxter (guitarra, steel guitar), Michael McDonald (teclado, sintetizador, vocais principais e de apoio), Tiran Porter (baixo, vocais principais e de apoio), John Hartman (bateria) e Keith Knudsen (bateria e vocais principais e de apoio).