“Estampado” (BMG/Ariola, 2003), Ana Carolina

Por Sidney Falcão

Desde o lançamento de seu primeiro álbum autointitulado, em 1999, Ana Carolina conquistou o público com sua voz marcante e letras poéticas. A canção "Garganta" rapidamente se tornou um hit, projetando-a para o estrelato e rendendo comparações com nomes como Cássia Eller (1962-2001), Zélia Duncan e Adriana Calcanhotto. Seu segundo álbum, Ana Rita Joana Iracema (2001), contendo faixas como "Quem de Nós Dois (La Mia Storia Tra le Dita)" e “Pra Terminar”, consolidou sua posição no cenário musical, explorando uma gama de sonoridades que iam do pop ao samba. Influenciada por grandes ícones da MPB, como Maria Bethânia, Chico Buarque, Elza Soares (1930-2022) e a já citada Cássia Eller, Ana Carolina desenvolveu um estilo próprio, caracterizado pela profundidade emocional e intensidade de interpretação. No entanto, foi com Estampado que a cantora mineira atingiu o ápice de sua carreira, entregando um trabalho que superou as expectativas e a firmou como uma das maiores artistas da música brasileira contemporânea.

O repertório do disco Estampado apresenta um perfil temático centrado em sentimentos intensos, como mágoa, amor, desilusão e autodescoberta. As canções exploram as complexidades dos relacionamentos, o confronto entre o desejo de seguir em frente e a dor da separação, e a busca por libertação emocional. Além disso, o álbum aborda o conflito entre o passado e o presente, refletindo sobre memórias, arrependimentos e a tentativa de reconstrução pessoal.

Estampado começa com a faixa “Hoje Eu Tô Sozinha”, que narra o término de um relacionamento insatisfatório. O eu lírico escolhe a solidão como um caminho de autodescoberta e busca de liberdade. Em seguida, a balada “Encostar Na Tua” destaca-se como uma das mais conhecidas do álbum, onde Ana Carolina expressa o desejo de encontrar uma conexão com outra pessoa, em busca de um encontro que dê sentido à sua existência, mesmo que essa jornada seja incerta e desafiadora.

Capa do primeiro e autointitulado álbum de Ana Carolina, lançado em 1999,
o mesmo traz o primeiro sucesso da cantora, "Garganta".

Na faixa “2 Bicudos”, o foco é em um relacionamento intenso e repleto de obstáculos, que resiste apesar das dificuldades e das opiniões alheias. A metáfora do alarme inaudível simboliza o amor inevitável que une o casal de forma arrebatadora. Já em "Elevador (Livro de Esquecimento)", Ana Carolina explora as dores de um relacionamento incerto, enfrentando a hesitação do outro e a própria vulnerabilidade emocional. O refrão “E subo bem alto / Pra gritar que é amor / Eu vou de escada / Pra elevar a dor” é uma poderosa metáfora para a tentativa de elevar tanto os sentimentos quanto a dor de um amor não correspondido.

“Só Fala em Mim" aborda uma relação marcada pela separação e pela indecisão, onde o eu lírico reflete sobre a distância emocional e a necessidade de seguir em frente, apesar da insistência do outro. Em "É Hora da Virada", a personagem da canção se mostra decidida e autoconfiante, consciente de seus objetivos e disposta a seguir em frente, mesmo que isso signifique deixar para trás alguém que ainda ama.

"Uma Louca Tempestade" revela o desejo de libertação e renovação após um relacionamento conturbado. A letra sugere uma jornada de transformação pessoal, usando imagens como "tarde gris" e "chuva" para simbolizar o abandono das memórias dolorosas e a busca por um novo caminho.

"Pra Rua Me Levar" reflete sobre a aceitação da solidão e o processo de autoconhecimento. O eu lírico segue em frente, sem pressa, enquanto recorda um amor passado, mas prioriza seu próprio crescimento e independência. Em "É Mágoa", Ana Carolina canta sobre a dor e o ressentimento que persistem após o fim de um relacionamento, abordando temas como vingança e a dificuldade de superar o sofrimento.

Detalhe de uma das partes do encarte do álbum Estampado.

“Mais Que Isso” explora o amor verdadeiro e profundo, enquanto “Vox Populi” critica os julgamentos constantes das pessoas, com o eu lírico demonstrando indiferença em relação às opiniões externas. Em “Vestido Estampado", a metáfora do vestido representa o que sobrou de um relacionamento acabado, marcado pelo desgaste e pelo “desbotamento” do amor.

“Nua” expõe a angústia de alguém que se sente invisível para a pessoa amada, capaz de gestos desesperados, como andar despida em público, para chamar sua atenção. A canção explora o medo da solidão e da rejeição. Já “Não Fale Desse Jeito” é uma canção sobre rejeição e descontentamento com o tratamento recebido, expressando o desejo de distância e o direito de não ser incomodado por críticas ou desrespeito.

O álbum fecha com a dançante “O Beat e a Beata”, com participação especial de Seu Jorge. A faixa celebra a diversidade e a inclusão, abordando diferentes estilos de vida e desafiando preconceitos em um ambiente de festa, promovendo a aceitação dentro do cenário de uma boate.

Estampado foi um enorme sucesso comercial. Com mais de 600 mil cópias vendidas, garantiu a Ana Carolina um disco duplo de platina. O álbum gerou cinco singles de destaque: “Elevador (Livro de Esquecimento)”, “Uma Louca Tempestade”, “Nua” e “Pra Rua Me Levar”, todos sucesso nas paradas de rádio brasileiras. Além disso, duas canções entraram em trilhas de novelas da Rede Globo: “Encostar Na Tua” foi tema de Bruno Gagliasso em Celebridade, enquanto “Uma Louca Tempestade” embalou a personagem Isabel, vivida por Carolina Dieckmann, em Senhora do Destino.

Em outubro de 2003, foi lançado o DVD Estampado, um documentário que revela os bastidores da produção do álbum, com performances de Ana Carolina e participações especiais de artistas como Chico Buarque, Maria Bethânia, João Bosco, Seu Jorge, Chico César e Liminha. No ano seguinte, em novembro de 2004, o DVD Estampado - Um Instante Que Não Pára foi lançado, registrando um show ao vivo no Claro Hall, Rio de Janeiro, em agosto de 2004, para um público de 9 mil pessoas.

Faixas

Todas as faixas escritas e compostas por Ana Carolina, exceto onde indicado.