“Risqué” (Atlantic Records, 1979), Chic


Por Sidney Falcão

O Chic fechou o ano de 1978 estourado nas paradas de todo o mundo com o megahit “Le Freak”, faixa do terceiro álbum de estúdio da banda, C’est Chic, lançado naquele ano. Com o estouro de “Le Freak” nas paradas, as ótimas vendagens do single (chegando à marca de 6 milhões de cópias em todo o mundo) e do álbum C’est Chic (1 milhão de cópias vendidas somente nos Estados Unidos), o Chic estava com seu prestígio em alta dentro da gravadora Atlantic Records, especialmente o do guitarrista Nile Rodgers e do baixista Bernard Edwards (1952-1996), a dupla criativa do Chic.

A dupla estava com o prestígio tão em alta que foi incumbida pela gravadora a salvar o quarteto vocal Sisters Sledge, que apesar do talento, não conseguia decolar comercialmente com seus discos. Rodgers e Edwards escreveram todas as canções e produziram o terceiro álbum das garotas, e o resultado foi certeiro: o álbum We Are Family foi um sucesso instantâneo. O álbum bateu a casa de 1 milhão de cópias, e emplacou três super hits, “He’s Greatest Dancer”, “Lost In Music” e a faixa-título, a mais famosa do álbum, virou um clássico da disco music e maior sucesso da carreira das quatro irmãs.

No rastro do sucesso de C’est Chic, aclamado pela crítica e com o prestígio na estratosfera dentro da Atlantic Records, o Chic entrou no estúdio cheio de confiança para preparar o seu terceiro álbum. Intitulado Risqué e com uma capa muito bem caprichada e bem condizente com a elegância da banda, o terceiro álbum do Chic foi lançado em 30 de julho de 1979, e num momento tenso para os artistas da disco music.

Embora desse sinal de desgaste e saturação devido à superexposição, tão comuns a todo modismo, a disco music ainda tinha algum fôlego comercial. No entanto, semanas antes do lançamento de Risqué, um evento vergonhoso articulado pelo radialista e humorista americano Steve Dahl, chamado de Disco Demolition Night (Noite da Demolição Disco), promoveu uma cerimônia abominável no intervalo de uma partida de beisebol no estádio Comiskey Park, em Chicago, onde milhares de discos de artistas da disco music, entre álbuns e singles, foram destruídos. Era uma explícita reação de uma parcela retrógrada da sociedade americana contra a disco music. Naquele ato bizarro contra a disco music, no fundo, estava incluída toda uma série de preconceitos como racismo, homofobia, sexismo e xenofobia, afinal, o estilo nasceu nas casas noturnas frequentadas por negros, gays e latinos no começo dos anos 1970, quando o estilo ainda era algo de gueto antes de virar uma máquina de gerar dinheiro para a indústria fonográfica.

Chic, da direita para esquerda: Bernard Edwards, Alfa Anderson, 
Tony Thompson, Luci Martin e Nile Rodgers.


Apesar dos detratores, a disco music conseguiu emplacar álbuns naquele ano de 1979, que foram muito bem comercialmente como Bad Girls, de Donna Summer, Spirits Taking Flown, dos Bee Gees, e Risqué, do Chic.

Composto apenas de sete faixas, Risqué ratifica a elegância e o refinamento pop do Chic já mostrados nos álbuns anteriores. Talvez até, em Risqué, a banda tenha ido mais além. O Chic transita com toda a sua desenvoltura pela disco music, pelo funk e R&B. Enquanto as vocalistas Alfa Anderson e Luci Martin expressam toda a graciosidade e charme nos vocais, a guitarra cheia de ritmo de Nile Rodgers, o baixo robusto de Bernard Edwards e a bateria precisa de Tony Thompson (1954-2003) criam a sonoridade elegante, polida e refinada que caracterizaram o Chic.

A ótima “Good Times”, faixa que abre Risqué, traz a sua linha de baixo icônica e refrão contagiante, dando o tom para todo o álbum. É uma celebração da vida, do amor e da alegria de dançar até o amanhecer. A linha de baixo de “Good Times” teria sido inspirada em “Hollywood Swinging”, do Kool & The Gang, canção lançada pela banda em 1974.

O clima contagiante é quebrado por “A Warm Summer Night”, uma balada romântica de ritmo arrastado e monótono por longos seis minutos. É aqui o ponto mais crítico em se tratando de um álbum. A monotonia é afugentada por “My Feet Keep Dancing”, faixa essencialmente dançante, pop, e com um refrão “grudento”. 

Chic numa apresentação ao vivo em Londres, em 1979.

“My Forbidden Lover” abre o lado 2 do álbum em clima dançante onde Alfa Anderson e Luci Martin cantam sobre o amor proibido por um homem misterioso e enganador, seguida pelo ritmo funk cadenciado de “Can’t Stand To Love You”. Na balada “Will You Cry (When You Hear This Song)”, Alfa Anderson interpreta uma mulher que finalmente consegue se livrar do amor por um homem que a fez sofrer muito, e que agora, será ele quem irá chorar.

O álbum chega ao fim com "What About Me?", faixa que expressa a decepção e tristeza de uma garota que após entregar-se por amor a um sujeito, este a abandonou depois de conseguir o que queria. A letra triste da canção contrasta com o ritmo suingado e dançante proporcionado pela banda Chic que põe todo mundo para dançar.

Risqué foi bem recebido pela crítica, assim como pelo público. O álbum alcançou o posto de 2º lugar na parada de álbuns de R&B nos Estados Unidos, e 29º lugar na parada de álbuns do Reino Unido.

Mas o grande legado deixado por Risqué foi sem sombra de dúvidas a faixa “Good Times”, não apenas comercialmente como artisticamente. O single de “Good Times” foi um sucesso fenomenal ao chegar à marca de 5 milhões de cópias vendidas e alcançar o posto de 1º lugar da Billboard Hot 100, nos Estados Unidos. “Good Times” tornou-se, ao longo do tempo, uma das canções mais influentes da música pop em todos os tempos. Foi sampleada inúmeras vezes e sua linha de baixo inspirou uma enorme quantidade de músicas. De “Rapper’s Delight”, da Sugarhill Gang (primeiro rap gravado da História), a “2345meia78” do rapper brasileiro Gabriel O Pensador, passando por “Another One Bites The Dust”, do Queen, “Rapture”, do Blondie e “Hot! Hot! Hot!”, do The Cure, só para citar alguns exemplos entre tantos.

Embora a disco music tivesse entrado em declínio a partir de 1979, Risqué foi um dos álbuns mais marcantes do estilo e também influentes. O sucesso do álbum, do ponto de vista criativo, levou Nile Rodgers e Bernard Edwards a serem bastante requisitados pelos mais diversos artistas da música pop no adentrar dos anos 1980. Seja como dupla ou individualmente, eles foram responsáveis por produzir álbuns de artistas como Diana Ross, Debbie Harry, David Bowie, Johnny Mathis, Madonna, Duran Duran, Robert Palmer, o que só comprova o quanto a obra do Chic foi tão influente, ultrapassando as fronteiras da disco music e do R&B.


Faixas

Todas as faixas foram compostas por Nile Rodgers e Bernard Edwards.

Lado 1

  1. "Good Times"
  2. "A Warm Summer Night"      
  3. "My Feet Keep Dancing" 

Lado 2

  1. "My Forbidden Lover"            
  2. "Can't Stand to Love You"     
  3. "Will You Cry (When You Hear This Song)"  
  4. "What About Me?"

 

Chic: Alfa Anderson e Luci Martin (vocais), Nile Rodgers (guitarra e vocais), Bernard Edwards (baixo e vocais) e Tony Thompson (bateria).


"Good Times"

"A Warm Summer Night"

 

"My Feet Keep Dancing"

"My Forbidden Lover"

 

"Can't Stand to Love You"

     
"Will You Cry (When You Hear This Song)"  


"What About Me?"


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