"Christopher Cross" (Warner, 1979), Christopher Cross

Por Sidney Falcão

Em agosto de 1970, a banda britânica Deep Purple estava de passagem pelos Estados Unidos com uma turnê para promover o álbum ... In Rock. No dia 28 daquele mês, quando a banda ia se apresentar no Jam Factory, em San Antônio, no estado do Texas, uma forte gripe impediu que o guitarrista Ritchie Blackmore se apresentar.

A princípio, a solução era cancelar o show, embora a banda estivesse disposta a tocar. Contudo, o contratante do show, Joe Miller, encontrou uma solução: sugeriu um guitarrista local para tocar no lugar de Blackmore, e assim salvar a apresentação da banda naquela cidade. A banda aceitou a sugestão de Joe, o guitarrista foi convocado e o show transcorreu tranquilamente. O tal guitarrista que salvou aquela apresentação era um jovem de 19 anos chamado Christopher Cross, integrante de uma banda de rock local chamada Flash, e que tinha como empresário o próprio Joe Miller, o contratante do show. O que ninguém imaginava é que quase dez anos depois, aquele jovem guitarrista se tornaria um astro da música mundialmente famoso.

Em meados da décad de 1970, Christopher Cross deixou a banda Flash, e decidiu tentar carreira como cantor e compositor. Por volta de 1979, Cross assinou contrato com a gravadora Warner. Em julho do mesmo ano, ocorreram as gravações do álbum de estreia de Cross, que teve como produtor Michael Omartian. A gravações contaram com a participação de músicos renomados como os guitarrista Eric Johnson e Larry Carlton, o cantor Michael McDonald (então vocalista dos Doobie Brothers), Don Henley (baterista e vocalista dos Eagles) e da cantora Nicolette Larson (1952-1997), cantora que havia feito muito sucesso com a canção "Lotta Love", de Neil Young", em 1978.

Intitulado apenas como Christopher Cross, o álbum é um trabalho essencialmente de soft rock. Ao longo de dez faixas do disco, é possível perceber influências de música pop, rock e jazz. As canções são dotadas de melodias suaves e agradáveis, e os arranjos são meticulosamente bem trabalhados. Guitarras melódicas, teclados envolventes e harmonizações vocais bem-cuidadas criam toda uma sonoridade acolhedora.

Quanto aos temas abordados, as letras tratam desde reflexões sobre relacionamentos e sentimentos de perda até histórias de fuga e escapismo, passando por outros temas como esperança, amor, nostalgia e questionamentos sobre a vida. O álbum é um retrato multifacetado das emoções humanas.

"Say You'll Be Mine" inicia o álbum com um arranjo suave e melodia agradável, com guitarras e teclados suaves, e uma seção rítmica discreta. Christopher Cross conta com a participação especial da cantora Nicolette Larson fazendo os vocais de apoio. Ambos cantam uma letra sobre a esperança de um amor duradouro, transmitindo um sentimento de desejo e otimismo por um relacionamento estável. 

O jovem Christopher Cross numa apresentação ao vivo no final dos anos 1970. 

"I Really Don't Know Anymore" é uma balada pop rock agradável, com arranjos de teclado e guitarras melódicas. Nesta faixa, o ilustre convidado de Cross é o cantor Michael McDonald. A letra de "I Really Don't Know Anymore" reflete sobre a incerteza da vida e dos relacionamentos, expressando dúvidas e um estado de inquietude diante das situações da vida. 

"Spinning", a faixa seguinte, é uma balada romântica em que Christopher Cross faz dueto com a cantora Valerie Carter. A letra aborda a sensação de confusão emocional, mas com a esperança de encontrar clareza e uma nova perspectiva. 

"Never Be The Same" é um soft rock de melodia agradável, romântico. É caracterizado por uma suave melodia de piano e teclados, e vocais femininos de apoio que dão um caráter delicado, romântico e acolhedor à canção. O solo de guitarra de Jay Graydon dá um toque roqueiro a um dado momento da canção. O tema da letra de "Never Be The Same" explora a transformação de uma pessao após o fim relacionamento conjugal, revelando emoções de nostalgia, melancolia e reconhecimento das mudanças após uma separação. 

Fechando o lado 1 do álbum, "Poor Shirley", uma canção que começa com um naipe de cordas que faz lembrar o pop barroco dos anos 1960 já praticado por bandas como Beach Boys, Beatles e The Zombies. Mas que em seguida, a canção toma um rumo completamente diferente. Os versos contam a história de uma mulher chamada Shirley e as suas dificuldades na vida. Transmite compaixão e empatia por Shirley, explorando seus desafios e emoções. 

O lado 2 do álbum começa com "Ride Like The Wind", um soft rock por excelência e que possui uma base instrumental imponente, com arranjos muito bem construídos. Impressiona a presença notável das guitarras, dos teclados, metais, vocais de apoio e uma seção rítmica vigorosa. Merece destacar o solo de guitarra do próprio Christopher Cross, mostrando todo a sua habilidade como guitarrista e a participação mais uma vez de Michael McDonald nos vocais de apoio. A letra de "Ride Like The Wind" é sobre um fugitivo disposto "a correr como o vento" até a fronteira do México, onde espera encontrar liberdade ou um novo começo. 

Assim como Don Henley e Nicolette Larson, Michael McDonald (foto) é
um dos convidados do álbum de estreia de Christopher Cross.

"The Light Is On" é uma balada pop rock romântica que destaca-se pela suavidade dos arranjos de teclado, guitarras e harmonia vocal. Há uma unidade de percussão que cria dá ares de latinidade à canção. Os versos da canção falam sobre esperança e conforto em tempos difíceis, transmitindo uma sensação de acolhimento e otimismo. 

"Sailing" é a faixa mais famosa deste álbum. É uma linda balada romântica, com uma linha melódica delicada, reconhecida por seus arranjos suaves de teclado, guitarras e uma seção de cordas. O solo de piano executado por Michael Omartian é a "cereja do bolo" desta canção. A letra de "Sailing" usa a metáfora de velejar como uma forma de escapar das pressões da vida. Fala sobre a busca por lugares como o paraíso, a Terra do Nunca e a sanidade, destacando a capacidade de encontrar serenidade ao permitir que os sonhos guiem e o vento leve em direção à liberdade. A suavidade da base instrumental da canção enriquece o conteúdo dos versos desta obra-prima de canção. 

"Minstrel Gigolo" finaliza este álbum de estreia de Christopher Cross. Curiosmente, é um soft rock que remete ao Elton John dos primeiro álbuns. A letra de "Minstrel Gigolo" fala sobre um músico cujas canções românticas atraem admiradoras. Ele é como um gigolô musical, não no sentido tradicional, mas como alguém cujas músicas conquistam os corações das mulheres.

O álbum Christopher Cross teve um desempenho comercial brilhante. O álbum alcançou o 6° lugar da Billboard 200, nos Estados Unidos, onde vendeu mais de 5 milhões de cópías. No Reino Unido e na França, o álbum vendeu mais de 300 mil cópias. Quatro singles foram extraídos do álbum: "Ride Like The Wind", "Sailing", "Never Be The Same" e "Say You'll Be Mine". O single de "Ride Like The Wind" chegou ao 3° lugar parada de singles do Reino Unido e 4° lugar na da Espanha.

Com o sucesso fenomenal de seu álbum de estreia, Christopher Cross ganhou grande visibilidade midiática e tornou-se um dos maiores astros da música pop do começo dos anos 1980. Cross era uma figura quase que onipresente. Em 1980, por exemplo, Cross conquistou quatro prêmios Grammy: "Gravação do Ano" ( por "Sailing"), "Álbum do Ano" (por Christopher Cross), "Canção do Ano" (por "Sailing") e "Artista Revelação". Esse feito só foi igualado em 2020, quando a cantora Billie Eilish também ganhou quatro prêmios Grammy. Em 1981, Christopher Cross co-escreveu "Arthur's Theme (Best That You Can Do)", em parceria com Burt Bacharach (1928-2023) e Peter Allen (1944-1992), tema do filme Arthur. A canção faturou o Oscar de "Melhor Canção Original" e alcançou 1° lugarna Billboard Hot 100, nos Estados Unidos.

Em 1983, quatro anos após o primeiro álbum, Christopher Cross lançou o segundo álbum, Another Page, que emplacou dois hits, "All Right" e "Think Of Laura". O trabalho contou com a participação especial de Art Garfunkel, Karla Bonoff e Carl Wilson (1946-1998). No entanto, Another Page não alcançou o mesmo sucesso comercial do álbum anterior. A partir de 1984, a popularidade de Cross entrou em declínio, embora o artista continuasse a lançar álbuns com regularidade.

O álbum Christopher Cross não apenas alcançou sucesso comercial extraordinário, vendendo milhões de cópias em todo o mundo, mas também deixou uma marca duradoura no cenário do soft rock. Com hits como "Sailing" e "Ride Like The Wind", o álbum solidificou-se como um clássico atemporal, destacando-se pela fusão única de soft rock, pop e elementos de jazz. Christopher Cross, o cantor, demonstrou sua habilidade singular ao criar composições melódicas profundas, com letras emotivas que ecoaram por décadas. Seu legado perdura como um marco significativo no mundo da música, influenciando gerações de artistas e reafirmando seu lugar entre os grandes clássicos do gênero soft rock.

Faixas

Todas as faixas foram compostas por Christopher Cross. 

Lado 1

  1. "Say You'll Be Mine"
  2. "I Really Don't Know Anymore"
  3. "Spinning" (dueto com Valerie Carter)
  4. "Never Be the Same"
  5. "Poor Shirley" 

Lado 2

  1. "Ride Like the Wind"
  2. "The Light Is On"
  3. "Sailing"
  4. "Minstrel Gigolo"   

Ouça na íntegra o álbum 
Christopher Cross

"Sailing"
(videoclipe oficial)




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