"Goodbye Yellow Brick Road" (DJM Records, 1973), Elton John


Por Sidney Falcão

Elton John era um astro do rock numa ascensão meteórica naquele início de década de 1970. O cantor vinha numa sequência espetacular de bons álbuns, como Honky Château (1972), que chegou ao 1º lugar da Billboard 200 e que vendeu mais de 1 milhão de cópias nos Estados Unidos. Don't Shoot Me I'm Only The Piano Player, o álbum seguinte, lançado no começo de 1973, foi mais além e alcançou o 1º lugar da parada de álbuns dos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, Canadá, Itália e Espanha.

Mas a consolidação de Elton John como astro do rock de primeira grandeza se deu com Goodbye Yellow Brick Road, sétimo álbum de estúdio do cantor inglês e seu primeiro álbum duplo. Um trabalho dotado de um ecletismo musical que ressaltou a qualidade da parceria Elton John/Bernie Taupin. 

O volume de criação de canções e de gravação de discos estava tão intenso naquele momento da vida de Elton John que no mesmo mês que Don't Shoot Me I'm Only The Piano Player estava sendo lançado, janeiro de 1973, o cantor inglês, sua banda e sua equipe técnica estavam viajando para Kingston, na Jamaica, onde iriam gravar o próximo álbum. As gravações ocorreriam no Dynamic Sound Studios, os mesmos estúdios onde os Rolling Stones haviam recém gravado o álbum Goat Head Soup.

Contudo, ao chegarem a Kingston, os ingleses encontraram um ambiente um tanto quanto hostil. A Jamaica passava por uma pesada tensão político-social, fomentada por rivalidades políticas locais. Como se isso não bastasse, ao chegarem ao Dynamic Sound Studios, encontraram instalações inadequadas para gravar o novo álbum de Elton John. Para completar, a populçaõ de Kingston estava na espectativa pela luta de boxe entre Joe Frazier e George Freeman, o que comprometeu as questões de logísitica num lugar tão deficitário de serviços. 

Por causa do ambiente inseguro e incerto, Elton John, banda e equipe técnica do artista decidiram deixar a Jamaica e adiar as gravaçõs do novo álbum. Em maio de 1973, as gravações foram retomadas, mas desta vez optaram em gravar no charmoso Château d'Hérouville, Hérouville, na França. Naquele estúdio francês, Elton John gravou os seus dois álbuns anteriores Honky Château e Don't Shoot Me I'm Only the Piano Player, ambos com o produtor Gus Dudgeon (1942-2022), que foi escalado para produzir o novo álbum. 

Elton John em sessão de gravação do álbum Goodbye Yellow Brick Road.

Ao retornarem a Château d'Hérouville, tudo fluiu muito bem e em grande velocidade. Na França, Elton e Taupin compuseram cerca de 22 novas canções, das quais foram seleciodandas 18 canções foram selecionadas. Duas delas foram unificadas e viraram uma só faixa, "Funeral For A Friend/Love Lies Bleeding". Em duas semanas, todo o material do novo álbum estava gravado. A princípio, não estava previsto que o novo trabalho seria um álbum duplo, mas diante do farto material composto e gravado, optou-se em lançar todo esse material num formato duplo. 

Lançado em 5 de outubro de 1973, Goodbye Yellow Brick Road traz como capa uma ilustração criada pelo ilustrador inglês Ian Beck, baseado no tema da canção que dá nome ao álbum. A arte mostra Elton John trajado num figurino extravagante tentando entrar num velho cartaz colado num muro de uma rua. O cartaz apresenta um caminho de tijolos amarelos que leva para um lugar campestre e bonito, e é para esse lugar tranquilo, bucólico que o personagem central da canção quer ir, longe da fama e da superficialidade da sociedade consumista.   

Ao longo de suas 17 faixas distribuídas em dois discos, Goodbye Yellow Brick Road se mostra um álbum musicalmente diversificado, no qual Elton John e sua banda de apoio transitam pelo rock progressivo, pop, hard rock, balada, country rock e até mesmo o reggae, que naquele ano de 1973 começava a alcançar o mundo. E para todo esse suporte diversificado e muito bem executado, Elton John contou com a sua banda de apoio formada pelos mesmo músicos que o acompanhoram nos dois dois álbuns anteriores, o guitarrista Davey Johnstone, o baixista Dee Murray e o baterista Nigel Olsson. 

Uma outra característica particular de Goodbye Yellow Brick Road é a referência do cinema nas letras de algumas canções, fazendo relações á alguns filmes específicos, gêneros cinematográficos ou mesmo um personagem. Há nesse caso um caráter pessoal de Bernie Taupin, que na parceria com Elton John, é o responsável por escrever as letras. Taupin empregou nessas letras de lagumas dessas canções o seu lado saudosista, nostálgico, de quando frequentava as salas de cinema na infância ou mesmo os filmes que via na TV. Em entrevista para a edição americana da revista Rolling Stone, em 2014, Taupin chegou a dizer que Goodbye Yellow Brick Road é um "álbum cinematográfico".

Elton John e o parceiro Bernie Taupin no início dos anos 1970.
Cinema foi referência para Taupin escrever as letras de algumas canções
do álbum Goodbye Yellow Brick Road.

O disco 1 de Goodbye Yellow Brick Road começa de forma épica com sintetizadores anunciando o início de "Funeral For A Friend/Love Lies Bleeding", uma longa faixa que é o resultado da fusão de duas músicas. A primeira parte da faixa é instrumental e tende para o rock progressivo, onde há um protagonismo do piano tocado por Elton John e pelo sintetizador tocado pelo engenheiro de som David Hentschel. A segunda parte da faixa se inclina para uma sonoridade mais pesada, tendendo para o hard rock, e aqui a guitarra de Davey Johnstone é quem domina a faixa. Os versos da segunda metade da faixa fazem referência a um relacionamento conjugal que chegou ao fim. 

"Candle In The Wind" é uma balada escrita por Bernie Taupin em homenagem a Marilyn Monroe (1926-1962), onde o eu lírico é um fã que presta a ela toda a sua reverência e reconhece as dores e os dramas por trás da fama vividos pela atriz americana. Anos mais tarde, em 1997, "Candle In The Wind" ganhou uma nova versão com sua letra reescrita por Taupin prestando um tributo à princesa de Gales Diana, que havia morrido numa acidente de carro naquele ano, aos 36 anos. A nova versão foi intitulada "Candle InWind' (England's Rose)", foi cantada por Elton John no funeral da princesa na Abadia de Westminster. 

"Bernie And The Jets" é quem encerra o primeiro lado do disco 1, uma canção sobre uma banda fictícia de rock cujo nome dá título à música.

O lado 2 do disco 1 abre com a faixa-título, um dos maiores sucessos da carreira de Elton John. A letra escrita por Bernie Taupin é autobiográfica e faz referência à infância do letrista e à fama alcançada na vida adulta. Taupin faz uso do filme O Mágico de Oz, de L. Frank Baum, de 1939 (a estrada de tijolos nos versos da canção é uma citação ao filme) que ele assitiu no cinema quando era criança como um recurso metafórico para demonstra o desejo de voltar às suas origens que foi a sua infância vivida numa fazenda em Lincolshie, no leste da Inglaterra.  

"This Song Has No Title" é uma balada de arranjos simples e que traz Elton John acompanhado pelo seu piano cantando versos fortes e pessemistas, mas que são difíceis de se imaginar o que teria inspirado Bernie Taupin a escrevê-los. "Grey Seal" é um pop rock de versos enigmáticos que Taupin já admitiu anos mais tarde não ter ideia do que eles querem dizer. Elton John cai no ritmo do reggae em "Jamaica Jerk Off", experiência que outras estrelas do rock como Paul Simon e Led Zeppelin também estavam experimentando na época. 

Depois do ritmo descontraído da faixa anterior vem a balada "I've Seen That Movie Too", uma canção que encerra o disco 1 e que claramente trata sobre traição numa relação conjugal, regada a mentiras e dissimulação.

Ray Bolger (Espantalho), à esquerda, Judy Garland (Dorothy) e 
Jack Haley (Homem de Lata) no filme O Mágico de Oz (1939):
inspiração para a canção "Goodbye Yellow Brick Road".

O disco 2 começa com "Sweet Painted Lady", canção sobre o que parece se tratar de algum marinheiro que ao chegar ao porto de alguma cidade, vai com seus companheiros de trabalho à procura de diversão e sexo em algum prostíbulo. "The Ballad Of The Danny Bailey (1909-34)" é outra canção escrita por Taupin influnciada pelo cinema, que no caso desta canção seriam os filmes sobre mafiosos. O personagem mafioso da canção foi criado por Taupin inspirado em Al Capone (1899-1947) e John Dellinger (1903-1934), sendo este último citado na letra da música. Na sequência, a controversa "Dirty Little Girl" e sua letra sexista sobre uma garota que teria uma suposta vida promíscua, segundo o ponto de vista do eu lírico que seria um homem. O primeiro lado do disco 2 termina com o rock "All The Girls Love Alice" que trata sobre as relações lésbicas de uma garota de 16 anos.

Abrindo o segundo lado do disco 2, “Your Sister Can't Twist (But She Can Rock 'n' Roll)” é um rock'n'roll retrô e veloz com Elton John tocando um piano energético, nervoso. “Saturday Night's Alright For Fighting” é um rock vibrante, inquieto, que traz Nigel Olsson numa performance demolidora na bateria enquanto que Davey Johnstone dispara riffs agressivos de guitarra. O clima fica mais calmo e saudosista com a balada "Roy Rodgers", um tributo ao herói dos filmes de faroeste que Bernie Taupin e Elton John costumavam assitir no cinema na infância. "Social Disease" é um country rock sobre um sujeito antissocial e mal humorado. Goodbye Yellow Brick Road termina com "Harmony" uma canção carregada de harminizações vocais e que versa o reencontro de duas pessoas que tiveram um envolvimento amoroso no passado, mas que com fim dessa relação ficou apenas a amizade. 

Goodbye Yellow Brick Road alcançou o 1° lugar na parada de álbuns da Billboard, nos Estados Unidos, e por lá permanceu no topo por oito semanas. Liderou também as paradas de álbuns do Reino Unido, Austrália e Canadá. Nos Estados Unidos, o álbum duplo vendeu mais de 8 milhões de cópias e mundialmente chegou à marca de 20 milhões de cópias vendidas. O álbum gerou quatro singles, "Saturday Night's Alright For Fighting", "Goodbye Yellow Brick Road", "Bennie And The Jets" e "Candle In The Wind". 

Em janeiro de 1974, quando ainda saboreava a consagração conquistada através de Goodbye Yellow Brick Road, Elton John entrou em estúdio com sua banda para gravar o próximo álbum, Caribou, em apenas nove dias e às vésperas de embarcar para um turnê pelo Japão e Oceania. Era o ônus do sucesso: Elton John havia se tornado uma máquina de fazer música e dinheiro.  

Faixas 

Todas as músicas são compostas por Elton John ; todas as letras foram escritas por Bernie Taupin.

Disco 1

Lado 1

  1. "Funeral For a Friend / Love Lies Bleeding" 
  2. "Candle In the Wind"
  3. "Bennie and the Jets"

Lado 2

  1. "Goodbye Yellow Brick Road"
  2. "This Song Has No Title"
  3. "Grey Seal"
  4. "Jamaica Jerk-Off"
  5. "I’ve Seen That Movie Too"


Disco 2

Lado 3

  1. "Sweet Painted Lady"
  2. "The Ballad of Danny Bailey (1909–34)"
  3. "Dirty Little Girl"
  4. "All the Girls Love Alice"

Lado 4

  1. "Your Sister Can’t Twist"
  2. "Saturday Night’s Alright for Fighting"
  3. "Roy Rogers"
  4. "Social Disease"
  5. "Harmony"


Elton John (vocais principais, piano, órgão, Mellotron)

Banda de Elton John: Davey Johnstone (guitarras acústicas, elétricas e slide, banjo, vocais de apoio), Dee Murray (baixo e vocais de apoio) e Nigel Olsson (bateriae vocais de apoio).


Referências:

Elton John – A biografia, David Buckley, 2011, Companhia Editora Nacional

eltonjohn.com

rollingstone.com

"Funeral For a Friend / Love Lies Bleeding" 

"Candle In the Wind"

"Bennie and the Jets"

"Goodbye Yellow Brick Road"

"This Song Has No Title"

"Grey Seal"

"Jamaica Jerk-Off"

"I’ve Seen That Movie Too"

"Sweet Painted Lady"

"The Ballad of Danny Bailey (1909–34)"

"Dirty Little Girl"

"All the Girls Love Alice"

"Your Sister Can’t Twist"

"Saturday Night’s Alright for Fighting"

"Roy Rogers"

"Social Disease"

"Harmony"

Comentários

  1. Há 50 anos o agora aposentado Sir Elton John lançava este que é o meu álbum favorito de sua discografia, uma grande obra-prima que vendeu mais de 30 milhões de cópias mundo afora, e que até hoje é visto como um dos maiores álbuns da música em todos os tempos. GYBR é a verdadeira síntese de tudo que o astro pop britânico foi durante sua meteórica trajetória: pop, rock, baladas, folk, country e o que mais você imaginar. Homenagem muito esperada e merecida feita por este blog, pois foi no ano passado que eu dei esta sugestão por aqui!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. De fato, é um grande álbum mesmo. E impressiona mesmo como a dupla Elton John e Bernie Taupin estavam num momento de muita criatividade.

      Excluir
    2. Com certeza, chefe... Um baita álbum que demonstra o momento do auge definitivo de um grande artista que foi Sir Elton John, que começou em 1972 e que para mim se encerraria em 1975 com o lançamento de "Captain Fantastic & the Brown Dirt Cowboy" - outro álbum do astro pop britânico que eu aprecio bastante também. Valeu pela resposta!

      Excluir
  2. Marilyn e Lady Diana morreram aos 36 anos,diga-se,Elis Regina também.

    ResponderExcluir
  3. Qualquer hora eu ouço o álbum duplo,tem muita coisa que desconheço.

    ResponderExcluir

Postar um comentário