"Estúpido Cupido"- trilha sonora nacional da novela (Som Livre, 1976), várioas artistas


Por Sidney Falcão

No dia 25 de agosto de 1976, estreava às 19h, na TV Globo, a novela Estúpido Cupido, escrita por Mário Prata e dirigida por Régis Cardoso (1934-2005). A história da novela é ambientada na cidade fictícia cidade chamada Albuquerque, interior do estado de São Paulo, no começo dos anos 1960. Influenciada pela cultura americana que passou a ser referência de comportamento para o mundo após a Segunda Guerra Mundial, a juventude de Albuquerque gosta de rock'n'roll, twist, filmes americanos, blusões de couro e andar de lambreta re moto pelas ruas daquela cidade. 

Dentre os personagens da novela, destacam-se Maria Tereza (Françoise Forton), que sonha em morar na capital e ser Miss Brasil. Namorado de Maria Tereza, João (Ricardo Blat) deseja ser jornalista e tem ciúmes de sua namorada. Manderiquis é um jovem playboy, um rebelde sem causa sustentado pela mesada do pai e que vive andando de lambreta com os amigos. Belchior (Luiz Armando Queiroz) é o louco da cidade, que anda pelas ruas e praças pensando ser locutor de uma rádio imaginária. Freira e professora de um colégio católico, Irmã Angélica (Elizabeth Savalla) sente um amor platônico pelo louco Belchior. 

Para embalar as tramas dessa novela, a TV Globo prepararou um repertório que curiosamente é boa parte dele formado por canções originais dos primórdios do rock brasileiro, lançadas entre o final dos anos 1950 e meados dos anos 1960, um período que antecede a Jovem Guarda. Mas há também canções de outros estilos como bossa nova, estilo musical que vivia o seu auge no período citado. 

Casal protagonista da novela Estúpido Cupido, João (Ricardo Blat)
e Maria Tereza (Françoise Forton).

O disco começa com Celly Campello (1942-2003) cantando "Banho de Lua", versão em português de "Tintarella di Luna", sucesso da cantora italiana Mina, de 1959. Lançada em 1960, "Banho de Lua" foi um dos grandes sucessos da da carreira de Celly Campello. Em 1969, "Banho de Lua" foi regravada pelos Mutantes. 

Depois do rock'n'roll de "Banho de Lua", chega o romantismo de "Quem É" na voz de Osmar Navarro (1930-2012), que canta versos sobre um homem apaixonado capaz de atender a todas as vontades da mulher que ele ama. O romantismo prossegue na faixa seguinte, com Carlos Gonzaga e a balada "Diana", que fez um grande sucesso em 1958, e trata sobre o eu lírico que expressa toda a sua paixão pela mulher conhecida como Diana, a quem diz que ninguém mais que ele a amou. A canção é uma versão em português de "Diana" gravada por Paul Anka em 1957.

Após duas baladas juvenis, o disco mergulha nas prufudezas sentimentais de "Meu Mundo Caiu", com Maysa (1936-1977), canção que em 1958 transformou a cantora numa grande estrela da música brasileira. Composta pela própria Maysa, "Meu Mundo Caiu" é sobre uma mulher que vive a dor do desprezo do homem por quem ela é apaixonada. O canto de Maysa é cheio amargura, condizente com os versos dramáticos da canção. 

O clima fica mais animado com "Broto Legal", na voz de Sérgio Murilo (1941-1992), um dos pioneiros do rock brasileiro ao lado de Celly Campello, Tony Campello, Ronnie Cord (1943-1986), Carlos Gonzaga e Wilson Miranda (1940-1986). "Broto Legal" é uma versão para o português por Renato Côrte Real para "I'm In Love", uma canção gravada por Arlene Fontana em 1959. Com uma letra que trata sobre uma garota de beleza estonteante e que encantou a todos numa festa, "Broto Legal" foi regravada também por Celly Campello. 

Cena da novela Estúpido Cupido com os personagens Tavico (João Carlos Barroso),
Mederíquis (Ney Latorraca) e Maria Tereza (Françoise Forton).

A próxima faixa é "Alguém É Bobo de Alguém", com Wilson Miranda (1940-1986), sucesso do cantor em 1960, e que é uma versão em português para "Everybody's Sombody's Food", originalmente gravada por Connie Fancis naquele mesmo ano. "Alguém É Bobo de Alguém" é mais canção sobre deisilusão amorosa em que um homem foi enganado pela mulher que ele amava. 

"Por Uma Noite" é a única música contemporânea presente nesta trilha sonora. Composta exclusivamente para a novela, é também a única instrumental presente nesta trilha e é executada por Stradivarius, provavelmente uma orquestra ou grupo de estúdio convocado pela Som Livre para gravar esta música. 

O lado 1 do disco termina com uma linda e singela balada na voz de Demétrius (1942-2019), "Rítmo da Chuva", lançada em 1964. "Rítmo da Chuva" é uma versão em português de "Rhythm Of The Rain", sucesso do grupo vocal americano do The Cascades em 1962. A versão em português foi escrita pelo próprio Demétrius em que o eu lírico ao ver a chuva caindo, recorda-se da garota por quem ainda é apaixonado, mas que foi embora. Triste e amargurado, ele pede à chuva para que ela traga a sua amada de volta. 

A cômica "Boogie do Bebê", com Tony Campello, irmão de Celly Campello, abre o lado 2 da trilha sonora. Na letra, um jovem rapaz tenta ter um momento mais íntimo com a sua namorada, mas o irmãozinho dela, um bebezinho atrevido, atrapalha o romance do casal através de choros e risadas incovenientes. "Boogie do Bebê" é uma versão em português escrita por Fred Jorge para "Baby Sittin' Boogie", gravada por Buzz Clifford (1941-2018) em 1960. 

Os irmãos Celly e Tony Campello. 

Composta por Aloísio de Carvalho, "Sereno" foi gravada por Paulo Molin (1938-2004) em 1958. "Sereno" é uma canção romântica sobre solidão e abandono. O eu lírico é um homem triste a vagar pelas ruas no sereno da madrugada a lembrar da mulher que ele ama, mas que o trocou por outra pessoa. 

"Neurastênico" foi lançada em 1954 pelo grupo Betinho & Seus Conjunto, um dos pioneiros do rock brasileiro. O grupo era liderada pelo cantor, compositor e guitarrista Alberto Borges de Barros, o Betinho (1918-2000). A letra é sobre um sujeito neurastênico, que reconhece sua condição e que precisa se tratar.  

Ronni Cord, um dos pioneiros do rock brasileiro, comparece nesta trilha sonora com "Biquini de Bolinha Amarelinha", uma versão em português que curiosmente foi feita pelo pai do cantor, Hervê Cordovil (1914-1979), maestro, pianista e compositor bastante respeitado no cenário musical brasileiro de sua época. A versão original em inglês foi lançada em 1960 por Brian Hyland, sob o título de "Itsy Bitsy Teenie Weenie Yellow Polka Dot Bikini". Ana Maria é a personagem da canção, uma garota que foi à praia vestindo um bikini que, para os padrões da época, era muito pequeno, chamando a atenção do público ao redor dela. "Biquini de Bolinha Amarelinha" foi regravada por Celly Campello e pela Blitz.  

Ronnie Cord, Demétrius, Sérgio Murilo e Carlos Gonzaga: pioneiros do rock
brasileiro presentes na trilha sonora da novela Estúpido Cupido,da TV Globo.

"Tetê", com Sylvia Telles (1934-1966), é mais uma canção fora do espectro rock'n'roll dominante do disco. Gravada por Sylvia Telles em 1960, "Tetê" é um samba-canção com uma inclinação para a bossa-nova. A canção possui uma base instrumental sofisticada que dá suporte para Sylvia fazer uso da voz doce e delicada para cantar versos sobre um amor que acabou. 

O samba-canção de ares bossa-novísticos cede lugar para o rock'n'roll "Bata Baby", com Wilson Miranda, uma música que é uma versão em português de "Long Tall Sailing", gravada por Little Richard (1932-2020) em 1958. Os Cariocas aparecem na trilha sonora com as suas harmonizações vocais fantásticas em "Ela É carioca!", um clássico da bossa-nova que exauta uma linda mulher carioca. 

A trilha sonora termina com Celly Campello cantando "Estúpido Cupido", um rock'n'roll que dá nome à novela e que é uma versão em português de "Stupid Cupid", música composta por Neil Sedaka e Howard Greenfield, e gravada originalmente pela cantora Connie Francis, em 1958. A versão em português foi gravada por Celly em 1959, quando a cantora tinha apenas 16 anos. Os versos de "Estúpido Cubido" referem-se a uma garota que pede ao cupido que a deixe em paz, que não quer mais saber de romance com ninguém após sofrer uma grande desiluasão amorosa com um rapaz que a fez sofrer muito. 

Última novela das 19h da TV Globo filmada em preto e branco, Estúpido Cupido foi um grande sucesso de público e crítica e teve seu último capítulo exibido em 28 de fevereiro de 1977. O último capítulo é o único da novela gravado totalmente a cores e a história avança quinze anos no tempo, ocorrendo em 1976. 

Assim como a novela, a trilha sonora Estupido Cupido - Nacional, fez um enorme sucesso comercial. Foram mais de 750 mil cópias. O disco teve o papel importante ao resgatar canções dos primórdios do rock brasileiro. 

O sucesso da novela e da trilha sonora contribuiu para que vários artistas pioneiros do rock brasileiro que estavam esquecido, voltaram a ter visibilidade na grande mídia, como foi o caso de Celly Campello, a melhor sucedidade nesse sentido, chegando a fazer várias apresentações ao vivo nos palcos e nos programas de TV. 

Faixas

Lado 1

1- "Banho de Lua" ("Tintarella Di Luna") (Franco Migliacci/Bruno de Filippi/versão: Fred Jorge) - Celly Campello

2- "Quem É' (Osmar Navarro/Oldemar Magalhães) - Osmar Navarro

3- "Diana" (Paul Anka/versão: Fred Jorge) - Carlos Gonzaga

4- "Meu Mundo Caiu" (Maysa) - Maysa

5- "Broto Legal" ("I'm In Love") (H. Earnhart/versão: Renato Corte Real) - Sergio Murilo

6- "Alguém É Bobo de Alguém" ("Everybody's Somebody's Fool") (Howard Greenfield/Jack Keller/versão: Fred Jorge) - Wilson Miranda

7- "Por Uma Noite" ("Dom Marcos") - Stradivarius

8- "O Ritmo da Chuva" ("Rhythm Of The Rain") (John Gummoe/versão: Demétrius) - Demétrius


Lado 2

9- "Boogie do Bebê ("Baby Sittin' Boogie") (Johnny Parker/Joachim Relin/versão: Fred Jorge) - Tony Campello

10- "Sereno" (Aloísio T. de Carvalho) - Paulo Molin

11- "Neurastênico" (Betinho/Nazareno de Brito) - Betinho e Seu Conjunto

12 - "Biquini de Bolinha Amarelinho Tão Pequenininho" ("Itsy Bitsy Teenie Weenie Yellow Polka Dot Bikini") (Paul Vance/Lee Pockriss/versão: Hervé Cordovil) - Ronnie Cord

13- "Tetê" (Roberto Menescal/Ronaldo Bôscoli) - Sylvia Telles

14- "Bata Baby" ("Long Tall Sally") (Enotris Johnson/Richard Penniman/Robert Blackwell/versão: Tony Chaves e D. Fulgêncio) - Wilson Miranda

15- "Ela É Carioca" (Tom Jobim/Vinicius de Moraes) - Os Cariocas

16- "Estúpido Cupido" ("Stupid Cupid") (Neil Sedaka/Howard Greenfield/versão: Fred Jorge) - Celly Campello 


Referências:

memoriaglobo.globo.com

teledramaturgia.com.br 


Ouça na íntegra Estúpido Cupido - 
trilha sonora nacional da novela

Abertura da novela Estúpido Cupido,
TV Globo, 1976. Tema de abertura 
"Estúpido Cupido", com Celly Campello


Comentários