“Honky Château” (DJM Records, 1972), Elton John



Por Sidney Falcão

Elton John era um astro da música em franca ascensão no começo dos anos 1970. Sua parceria com o letrista Bernie Taupin estava funcionando a pleno vapor, compondo uma infinidade de canções tal qual uma linha de montagem de uma fábrica de carros. Isso explica o fato de o cantor ter lançado entre 1969 e 1971, quatro álbuns de estúdio, um álbum ao vivo e uma trilha sonora. E isso era só o começo da projeção daquele jovem cantor no cenário pop mundial.

No entanto, apesar da franca ascensão, Elton John precisava de uma canção ou de um álbum capaz de alavancá-lo para o estrelado em escala mundial. Embora fosse um álbum muito bem produzido e que trazia duas canções memoráveis como “Levon” e “Tiny Dancer”, Madman Across The Water (1971) não foi capaz de catapultar Elton John para o primeiro escalão do cenário pop internacional. Madman Across The Water não conquistou o público na época de seu lançamento, talvez por causa do seu perfil de rock sinfônico. A revista americana Rolling Stone acusou o álbum de ser “difícil” e “insuportavelmente denso”. Somente ao longo das décadas foi que Madman Across The Water teve o seu valor artístico reconhecido.

O sucessor de Madman Across The Water deveria ser um álbum com uma proposta diferente, um pouco mais acessível musicalmente, o que não significaria que se deveria abrir mão da qualidade, evidentemente. Segundo o engenheiro de som que trabalhou com Elton John à época, Ken Scott, Honky Château, álbum que sucedeu Madman Across The Water, foi concebido como início de uma nova página na história musical de Elton John. Para o novo álbum, as canções deveriam ser mais curtas e os arranjos menos complexos.

As gravações de Honky Château ocorreram em janeiro de 1972, na França, e a razão para gravarem naquele país foi a mesma que levou os Rolling Stones a gravarem Exile On Main St. também lá: fugir das altas cargas tributárias britânicas.

O astro e sua banda, da esquerda para a direita: Nigel Olsson, Elton John,
Dee Murray e Davey Johnstone.

Para a gravação do novo álbum na França, Elton John e sua equipe escolheram o Château d'Hérouville, um castelo construído no século XVIII em Hérouville, e que no final da década de 1960, foi transformado em estúdio de gravação. Isso explica o porquê do álbum se chamar Honky Château, uma homenagem ao castelo onde o disco foi gravado. A produção do álbum foi comandada por Gus Dudgeon (1942-2002), produtor que já vinha trabalhando com Elton John desde o primeiro e homônimo álbum do cantor, lançado em 1969.

Um dado curioso na gravação de Honky Château é que pela primeira vez, Elton John gravou um álbum com a sua própria banda. Até então, Elton só atuava com a sua banda nos shows ao vivo. Por outro lado, os álbuns anteriores do cantor foram gravados com músicos de estúdio, era uma determinação da gravadora. A partir de Honky Château, Elton John passou a gravar os seus discos com a sua banda que o acompanhava nas turnês, composta por John Dee Murray (baixo e vocais de apoio), Nigel Olson (bateria, percussão e vocais de apoio) e o então recém efetivado Davey Johnstone (guitarra elétrica e violões). Johnstone havia participado das gravações de Madman Across The Water, mas como músico de estúdio contratado. Após as gravações daquele álbum, Elton decidiu efetivar o jovem guitarrista como integrante para a sua banda.

Diferente dos álbuns anteriores, em que Elton e Taupin compuseram as canções ao longo de meses, para Honky Château as canções foram compostas no mesmo período de gravação do álbum. À medida que as canções ficavam prontas, logo eram gravadas. Esse processo de criação e gravação tão veloz seria empregado nos álbuns seguintes, já que o contrato de Elton John com a DJM Records, previa absurdamente um álbum a cada seis meses. Se por um lado, isso fazia a alegria dos fãs por ter uma média de dois álbuns por ano do seu ídolo, por outro, se tornava um esquema de criação estafante. Era preciso ter um volume de material imenso para criar, e ainda conciliar tantos compromissos (gravações, apresentações em TV, turnês...).  

No mesmo mês em que ocorreram as gravações de Honky Château, Elton John conseguiu judicialmente mudar o seu nome de batismo. A partir de então, Reginald Kenneth Dwight passou a se chamar legalmente Elton Hercules John. O que antes era um nome artístico, tornou-se um nome oficial.

Château d'Hérouville: palácio do século XVIII no norte da França que virou
estúdio de gravação no século XX, onde Elton John gravou Honky Château.

Lançado em 19 de maio de 1972, Honky Château é um álbum mais “enxuto”, não possui os arranjos elaborados e complexos de Madman Across The Water. É perceptível, por exemplo, a ausência da orquestra de cordas, que foram tão marcantes nas canções de Madman Across The Water. No entanto, Honky Château mostra um Elton John direcionado para o pop rock, uma linha musical que ele iria trilhar e com a qual ele iria se consagrar através dos álbuns posteriores.

O repertório do álbum é eclético, é composto por baladas, rocks, country-rocks, blues e honk tonks (aquelas canções típicas dos cabarés do velho oeste americano). Honky Château trouxe como novidade a estreia dos músicos da banda de Elton John atuando como vocalistas de apoio, As harmonizações vocais que eles empregariam se tornariam uma marca registrada na sonoridade dos discos de Elton John.

Honky Château começa em clima de saloon do velho oeste dos Estados Unidos através de “Honky Cat”. A canção possui uma melodia agitada, seção de metais bem acentuada e um piano animado e irresistível tocado por Elton John. “Mellow”, a faixa seguinte, é uma balada lenta que versa sobre amadurecer ao lado de quem se ama.

“I Think I'm Going To Kill Myself” é sobre um garoto adolescente egocêntrico e fútil, que planeja suicidar-se para chamar a atenção. “Susie (Dramas)” traz uma mistura discreta de balanço soul com rock’n’roll, onde o refrão sutilmente remete ao refrão de “Jailhouse Rock”, sucesso de Elvis Presley (1935-1977).

O lado 1 de Honky Château termina com a música mais importante do álbum e um dos maiores sucessos da carreira de Elton John, “Rocket Man (I Think It’s Going To Be A Long, Long Time)”. Esta belíssima canção narra a solidão de um astronauta abordo de sua nave. Ele tenta lidar com a saudade da família que deixou na Terra para cumprir uma missão no espaço sideral. Os arranjos de “Rocket Man” são simplesmente sublimes. As harmonizações vocais de Johnstone, Murray e Olsson nesta canção se tornariam um padrão para o acompanhamento vocal para tudo que Elton John lançaria nos seus discos posteriores. Um dos elementos marcantes da canção são os efeitos de slide guitar feitos por Johnstone, que criam zumbidos sônicos que fazem uma alusão a um astronauta a flutuar na imensidão do espaço infinito.

Elton John com outras pessoas não identificadas no estúdio do Château d'Hérouville, 
na época da gravação do álbum Honky Château, no início de 1972.

“Salvation” abre o lado 2 na versão LP de Honky Château, uma canção que tem um coro com uma acentuação gospel. Musicalmente é uma boa canção, mas a letra é um tanto quanto entediante, simplória, ainda mais depois que se ouve a canção anterior, “Rocket Man”.

A faixa seguinte, “Slave”, é uma canção com uma melodia linda, mas que trata nos seus versos sobre um tema triste que é a escravidão. A letra versa sobre o drama da escravidão nos Estados Unidos, e cita, ainda que de forma indireta, a Guerra Civil Americana (1861-1865) que poderia concretizar o sonho da liberdade: “There's a rumor of a war that's yet to come, yet to come / That may free our families, free our families and our sons...” (“Há um boato de uma guerra que ainda está por vir, ainda está por vir / Isso pode libertar nossas famílias, libertar nossas famílias e nossos filhos...”).

“Amy” é outra canção de clima de saloon do velho oeste americano presente no disco. O balanço rítmico é irresistível, e traz como destaques o solo de violino elétrico de Jean-Luc Ponty e a percussão de Ray Cooper. A balada “Mona Lisa And Mad Hatters” seria uma visão de Bernie Taupin, letrista parceiro de Elton, sobre a cidade de Nova York quando visitou aquela cidade pela primeira vez, e sentiu-se um “peixe muito pequeno em um lago onde tudo é intenso”. Honky Château termina com a alegre e divertida “Hercules”, com seus vocais ao estilo doo-wop. A letra é sobre uma garota e o seu gato chamado Hercules.

Concerto de Elton John no New Haven Coliseum, New Haven, Connecticut,
Estados Unidos, 29 de setembro de 1972.

Diferente do seu antecessor, Honky Château teve avaliações positivas da crítica especializada. Para Jon Landau, crítico musical da revista Rolling Stone, considerou Honky Château "um álbum rico, caloroso e satisfatório que fica de cabeça e ombros acima do pântano dos lançamentos atuais". Robert Hilburn, do Los Angeles Times, afirmou que Honky Château era “Um dos trabalhos mais alegres do ano”.

A primeira apresentação ao vivo do repertório de Honky Château aconteceu 5 de fevereiro de 1972, no Royal Festival Hall, em Londres, Inglaterra, abrindo a turnê do álbum, mesmo antes de seu lançamento. Elton John e sua banda encerraram a turnê em 26 de novembro de 1972 com uma apresentação em St. Petersburg, nos Estados Unidos. Além dos Estados Unidos, a turnê passou pelo Reino Unido, Alemanha e Canadá.

Honky Château gerou dois singles, “Rocket Man” (2° lugar na parada de singles do Reino Unido e 6° lugar na parada da Billboard Hot 100, nos Estados Unidos) e “Honky Cat” (8° lugar na parada da Billboard Hot 100, nos Estados Unidos e 31° na parada de singles do Reino Unido).

Desde que lançou o seu primeiro álbum até aquele momento, o melhor desempenho de Elton John nas paradas de álbuns pelo mundo foi com Honky Château. O álbum alcançou o 1° lugar na parada de álbuns da Billboard, nos Estados Unidos, desbancando Exile On Main St, dos Rolling Stones, e permanecendo nessa posição por cinco semanas. Honky Château chegou ao 2° lugar no Reino Unido e 3° lugar no Canadá. E esse bom desempenho se deve muito ao sucesso mundial da canção “Rocket Man” que ajudou a impulsionar as vendas de Honky Château. Nos Estados Unidos, o álbum vendeu mais de 1 milhão de cópias.

Honky Château foi o primeiro de uma sequência espetacular de sete álbuns de Elton alcançando o 1° lugar das paradas de álbuns dos Estados Unidos, que se encerra com Rock Of The Westles, álbum lançado em 1975. O disco preparou terreno para o sucesso avassalador que Elton John alcançaria a partir de 1973, ano de lançamento dos álbuns Don't Shoot Me I'm Only The Piano Player e Goodbye Yellow Brick Road, inaugurando a fase de ouro do cantor inglês que duraria boa parte da década de 1970. É a época em que o cantor se consagra e se torna um astro do rock de primeira grandeza, lotando estádios, fazendo longas turnês e vendendo milhões de discos. 

Faixas 

Lado1

  1. "Honky Cat"   
  2. "Mellow"       
  3. "I Think I'm Going to Kill Myself"      
  4. "Susie (Dramas)"       
  5. "Rocket Man (I Think It’s Going To Be A Long, Long Time)" 

Lado 2

  1. "Salvation"    
  2. "Slave"
  3. "Amy"
  4. "Mona Lisas and Mad Hatters"        
  5. "Hercules"     

 

Elton John e banda:

Elton John (vocais, piano acústico (1–6, 8–10), Fender Rhodes (1), órgão Hammond (2, 4), harmônio (6)),

Davey Johnstone (banjo (1, 7); guitarras elétricas, acústicas e slide (2-10); vocais de apoio (3, 5, 6, 8, 10), guitarra de aço (7), bandolim (9)),

Dee Murray (baixo, vocais de apoio (3, 5, 6, 8, 10)),

Nigel Olsson (bateria (1–8, 10), pandeiro (2, 4), vocais de apoio (3, 5, 6, 8, 10), congas (7)) 

 

Referências: 

Elton John – A biografia, David Buckley, 2011, Companhia Editora Nacional 

Classic Pop Presents: Elton John Special Edition - 2016, Anthem Publishing, Bath, Reino Unido 

Eu, Elton John, Elton John – 2019, Editora Planeta do Brasil, São Paulo, Brasil 

eltonjohn.com 

wikipedia.org

"Honky Cat"

"Mellow"

"I Think I'm Going to Kill Myself"

"Susie (Dramas)"

"Rocket Man (I Think It’s Going To Be A Long, Long Time)"

(videoclipe oficial)

"Salvation"

"Slave"

"Amy"

"Mona Lisas and Mad Hatters"

"Hercules"

Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Este Honky Château é um discaço maravilhoso de Sir Elton John, onde o astro britânico finalmente inicia a sua melhor fase de carreira, que a meu ver se encerraria em 1975 com o lançamento de Captain Fantastic & the Brown Dirt Cowboy, outra obra-prima dele (após este álbum, nada mais que ele fez nos anos finais de 1970 me interessa). Ao lado do disco sucessor, o também excelente Don't Shoot Me, I'm Only the Piano Player, o Honky Château forma uma espécie de preparação para o estrondoso sucesso que viria em 1973, com Goodbye Yellow Brick Road, o best-seller de mais de 30 milhões de cópias vendidas em todo o mundo e que até hoje é o meu álbum favorito dele. Enfim, parabéns a mais este clássico cinquentão de 2022!

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    1. Obrigado pelo seu comentário, Igor. É verdade, a era de ouro de Elton John começa com este disco e termina em meados dos anos 1970. Ele teve hits grandiosos nos anos 1980, como "Little Jeannie" em 1980, e "Sad Songs", em 1984. Depois de "Nikita", em 1986, aí ficou complicado. Os grandes álbuns dele estão nos anos 1970, muito embora ele deva ter bons álbuns nos anos 1990 e 2000, apesar de nunca ter ouvido.

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    2. Pois é, patrão... Da fase pós-Captain Fantastic, se salva pouca coisa mesmo, pelo menos até "Nikita" o Elton gravou várias músicas que ficaram famosas também, como "Little Jeannie", "Sad Songs Say so Much", "Empty Garden", "Blue Eyes", "I'm Still Standing", "Crazy Water" e "Island Girl", só para citar exemplos. Mas o fino mesmo do cara, está nos primeiros anos de 1970 até o Captain Fantastic, isto é, tirando de minha parte a "trinca de injustiçados" formada por Tumbleweed Connection (1970), Madman Across the Water (1971) e Caribou (1974). No mais, longa vida á Sir Elton John, muito obrigado por atender meu pedido com uma resenha do Honky Château e fico no aguardo daquela resenha que eu pedi do Goodbye Yellow Brick Road para outubro desse ano, para fechar a trilogia. Valeu!

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