“Lado B Lado A” (Warner, 1999), O Rappa
Rappa Mundi (1996) deu a O Rappa, uma grande visibilidade no
cenário do pop rock brasileiro em meados dos anos 1990. O segundo álbum de
estúdio da banda carioca foi muito bem recebido pela crítica e pelo público. Apoiado
em faixas que tiveram boa execução no rádio e na TV como “Pescador de Ilusões”
e as releituras bem pessoais de “Vapor Barato” (sucesso de Gal Costa nos anos
1970) e a versão em português de “Hey Joe” (eternizado originalmente por Jimi
Hendrix), Rappa Mundi vendeu mais de 300 mil cópias.
O bom desempenho comercial e a avaliação positiva da
crítica, não fizeram O Rappa repousar nos louros do sucesso de seu segundo
álbum. A banda carioca queria mais, ir além, superar-se. E foi isso que o grupo
buscou ao conceber o seu terceiro álbum de estúdio, Lado B Lado A. Em
setembro de 1999, quando o álbum estava sendo lançado, o vocalista do Rappa,
Marcelo Falcão, respondeu para o jornal Folha
de S. Paulo: "Seria fácil fazer
um ‘Rappa Mundi 2’ e ganhar mais grana, mas não é isso. Nós amadurecemos, nossa
música melhorou a nossa vida. Agora é hora de ver quem entende realmente o que
é o grupo, quem são os fãs do Rappa. Eu definiria o nosso som como música de
personalidade".
Se musicalmente, Lado B Lado A representou a
maturidade da fusão rítmica do Rappa que já vinha desde os álbuns anteriores, o
álbum representou também a consagração do baterista Marcelo Yuka como um dos
melhores letristas de sua geração. Lado B Lado A consolida a imagem do
Rappa como uma banda politizada e engajada nas causas sociais. O álbum contou
com Chico Neves na produção de dez faixas, e com o baixista e produtor
norte-americano Bill Laswell, que produziu a faixa título e “Na Palma Da Mão”. Em
Lado
B Lado A, O Rappa mergulha mais intensamente em temas como violência
policial, ausência do Estado nas favelas e o abismo social que separa ricos e
pobres.
O Rappa em sua formação mais famosa, da esquerda para a direita: Marcelo Lobato, Lauro Farias, Marcelo Yuka, Marcelo Falcão e Xandão Menezes. |
Através de
uma levada rítmica que remete a Jorge Ben Jor, “Tribunal de Rua”, faixa que
abre o álbum, direciona seus versos contra a truculência policial nas
abordagens aos moradores das favelas cariocas. Em “Me Deixa”, O Rappa trata
sobre as invasões da polícia nos lares das favelas, muitas vezes sem
autorização judicial: “Podem os ‘homem’ vir
que não vão nos abalar / Os cães farejam o medo, logo não vão me encontrar / Não
se trata de coragem, mas meus olhos estão distantes / Me camuflam na paisagem /
Dando um tempo pra cantar”.
O
sincretismo religioso e a miscigenação racial estão presentes em “Cristo E
Oxalá”, promovendo o encontro do Catolicismo e Candomblé numa mesma fé: “Oxalá se mostrou assim tão grande / Como um
espelho colorido / Pra mostrar pro próprio Cristo como ele era mulato / Já que
Deus é uma espécie de mulato”. Um apagão em plena luz do dia numa favela,
faz refletir sobre uma vida simples e menos tecnológica em “O Que Sobrou do
Céu”.
“Se Não
Avisar, O Bicho Pega” discute o poder que o tráfico de drogas exerce sobre as
favelas cariocas e seus moradores. A música possui uma poderosa levada rítmica,
enquanto que o refrão traz um trecho sampleado do funk “You Get Me Hot”,
sucesso de Jimmy Bo Horne, de 1979.
“Minha Alma
(A Paz Que Eu Não Quero)”, é a faixa mais forte do álbum, e provavelmente, o
maior sucesso da carreira do Rappa. A canção toca sobre o fato comum nas
comunidades carentes das grandes cidades brasileiras dominadas pelo tráfico de
drogas: o silêncio ante a injustiça. Para poupar-se de possíveis retaliações e
do medo, as comunidades pobres preferem muitas vezes silenciar. O medo impõe
uma “paz” incômoda: “A minha alma tá armada
e apontada / Para cara do sossego / Pois paz sem voz, paz sem voz / Não é paz,
é medo”.
Cena do videoclipe de "A Minha Alma ( A Paz Que Eu Não quero)". |
A fé aparece
em mais uma faixa, “Lado B Lado A”, a mesma que dá nome ao álbum. Nesta faixa,
a banda mostra a fé de forma sincrética e como um instrumento de defesa dos menos
favorecidos para se protegerem da violência: “Eu sou guerreiro / Sou trabalhador
E todo dia vou encarar / Com fé em Deus / E
na minha batalha / Espero estar bem longe
Quando o rodo passar”.
Em “Favela”,
O Rappa saúda o samba e algumas personalidades que ajudaram a construir a sua
história, enquanto que em “Homem Amarelo”, a banda carioca promove nos versos o
encontro de culturas de povos estrangeiros com a cultura popular carioca
contemporânea, tendo como base instrumental, uma bem executada fusão de reggae,
dub e psicodelia.
“Nó De
Fumaça” faz referência à vida cotidiana nas favelas cariocas. Marcelo Falcão
canta cheio de raiva, manha e ritmo, o misto de rap e reggae “A Todas As
Comunidades do Engenho Novo”. Fechando o álbum, “Na Palma Da Mão”, outra faixa
do álbum
produzida
por Bill Laswell, e que traz o produtor tocando baixo.
Lado
B Lado A fez um grande sucesso, e pôs O Rappa no primeiro escalão do
rock brasileiro dos anos 1990. Com mais 500 mil cópias vendidas, Lado
B Lado A emplacou canções como “Minha Alma (A Paz Que Eu Não Quero)”,
“Me Deixa”, “O Que Sobrou do Céu” e “Tribunal de Rua”. Em agosto de 2000, durante o VMB
da MTV Brasil, o videoclipe de “Minha Alma” conquistou incríveis seis prêmios:
“Escolha da Audiências”, “Clipe do Ano”, “Clipe de Rock”, Direção”,
“Fotografia” e “Edição”. Na edição do VMB da MTV Brasil de 2001, foi a vez de
“O Que Sobrou do Céu” conquistar prêmios: “Clipe do Ano”, “Direção” e “Fotografia”.
Integrantes da banda O Rappa comemorando prêmio de melhor videoclipe por "A Minha Alma", no Vídeo Music Brasil da MTV, em 2000. |
No mesmo mês
em que O Rappa fez o polêmico boicote, uma tragédia marcou a carreira em seu
pleno auge. O baterista Marcelo Yuka foi baleado nas costas durante uma
tentativa de assalto, deixando-o paraplégico. Apesar da sua nova condição, Yuka
continuou membro da banda, mas para assumir as baquetas, houve uma mudança na
banda: o tecladista Marcelo Lobato assume a bateria, e seu irmão, Marcos
Lobato, tornou-se o novo tecladista, mas sem se tornar um membro fixo da banda.
Em 2004, por questões de divergência, Marcelo Yuka deixou O Rappa, e monta uma
nova banda, F.U.R.T.O.
Faixas
1 -
"Tribunal de Rua" (Marcelo Yuka
2 - "Me
Deixa" (Marcelo Yuka)
3 -
"Cristo e Oxalá" (Marcelo Yuka)
4 - "O
Que Sobrou do Céu" (Marcelo Yuka)
5 - "Se
Não Avisar o Bicho Pega" (Jorge Carioca, Marquinho PQD, Marcinho)
6 -
"Minha Alma (A Paz que Eu Não Quero)" (Marcelo Yuka)
7 -
"LadoB LadoA" (Marcelo Falcão, Marcelo Yuka)
8 -
"Favela" (Marcelo Falcão, Xandão Marcelo Yuka, Lauro Farias, Marcelo
Lobato)
9 -
"Homem Amarelo" (O Rappa)
10 -"Nó de Fumaça" (Marcos Lobato)
11 -"A
Todas as Comunidades do Engenho Novo" (Marcelo Falcão)
12 -"Na Palma da Mão" (Marcelo Yuka)
O Rappa:
Marcelo Falcão (voz; violão em
"Tribunal de Rua" e "A Todas As Comunidades Do Engenho
Novo"; guitarra em "Me Deixa" e "O Que sobrou do Céu";
tamborim e percussão de boca em "Me Deixa" e "Cristo e
Oxalá"; mellotron em "A Todas As Comunidades Do Engenho Novo";
flauta).
Xandão (guitarra; derbak em "Nó de
Fumaça"; vocal em "Se Não Avisar, o Bicho Pega")
Lauro Farias (baixo; baixo synth em
"Cristo e Oxalá"; vocal de apoio).
Marcelo Lobato (teclados, cuíca,
vibrafone, talk box; talking drum em "O Que Sobrou do Céu"; melódica,
programação MPC; derbak em "Favela"; mellotron flauta e vocal de
apoio).
Marcelo Yuka (bateria; rapping, loop;
percussão de boca em "Tribunal de Rua"; derbak, moog; agogô e
harmônio em "Minha Alma"; teclado; caixa em "Homem
Amarelo"; purrinhola em "Nó de Fumaça"; vocal de apoio).
Referências:
Revista Bizz –
outubro/1999 – Edição 171
“Folha de S.Paulo” – “Ilustrada” - Quarta-feira, 15 de Setembro de 1999
Wikipedia
"Tribunal de Rua"
"Me Deixa"
"Cristo e Oxalá"
"O Que Sobrou do Céu" (videoclipe original)
"Se Não Avisar o Bicho Pega"
"Minha Alma (A Paz que Eu Não Quero)"
"LadoB LadoA"
"Favela"
"Homem Amarelo"
"Nó de Fumaça"
"A Todas as Comunidades
do Engenho Novo"
"Na Palma da Mão"
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