“Led Zeppelin II” (Atlantic Records, 1969), Led Zeppelin



O Led Zeppelin começou o ano de 1969 voando alto com uma agitada sequência de turnês pela a América do Norte e Europa, e que se estenderia ao longo daquele ano. E não era para menos: a boa receptividade por parte do público pelo primeiro e homônimo álbum do quarteto inglês, lançado em janeiro daquele ano, acabou lotando a agenda de shows da banda.

Para aproveitar a boa maré, o Led Zeppelin já pensava no segundo álbum. Como a agenda da banda estava apertada e o tempo era escasso, as músicas para o álbum seguinte foram compostas e gravadas durante as turnês do primeiro álbum. A cada cidade que o Led Zeppelin passava para fazer show, a banda alugava um estúdio local para gravar material, e depois partiam para a próxima cidade para se apresentar. Por causa disso, aconteceram situações curiosas como uma música ter a base instrumental gravada em Londres, a voz em Nova York, a gaita em Vancouver e a mixagem em Nova York.

As sessões de gravação do segundo álbum ocorreram nos estúdios Olympic Studios e Morgan Studios em Londres, Inglaterra; estúdios A&M Studios, Quantum, Sunset, Mirror Sound e Mystic em Los Angeles, Califórnia; Ardent Studios, em Memphis, Tennessee; estúdios Atlantic Studios, A&R Studios, Juggy Sound Studios, Groove e Mayfair em Nova Iorque; e R&D Studios, em Vancouver, Canadá.

Jimmy Page, guitarrista e produtor do álbum, contou com o valioso apoio de Eddie Kramer, engenheiro de som que já havia trabalhado com Jimi Hendrix. Kramer teve um papel importante na mixagem das faixas e contribuiu para que elas, embora fossem gravadas em estúdios diferentes, dessem unidade sonora ao álbum.    

O produtor e engenheiro de som Eddie Kramer em 2019: papel fundamental no processo de
mixagem do álbum Led Zeppelin II.

Intitulado Led Zeppelin II, o álbum teve a arte de sua capa concebida pelo ilustrador e designer gráfico britânico David Juniper. Para criar a capa, Juniper partiu de uma antiga fotografia do Esquadrão de Combate nº1 da Força Aérea Alemã, que participou da Primeira Guerra Mundial, e era comandada por Manfred von Richthofen (1892-1918), mais conhecido como “Barão Vermelho”. O artista gráfico recortou os rostos dos integrantes do Led Zeppelin e os colou sobre os rostos de alguns pilotos presentes nas fotos. Juniper teria inserido na montagem também os rostos de Peter Grant (empresário do Led Zeppelin), e de Richard Cole (gerente de turnê da banda).

O rosto de uma mulher loira presente na capa, é outra montagem, é da atriz Glynis Johns. A montagem teria sido uma brincadeira com o engenheiro de gravação, Glyn Johns, por causa da semelhança do seu nome com o da atriz.

Após mais de sete meses de gravações nos mais diversos estúdios de cidades diferentes, a Atlantic Records lançava Led Zeppelin II, em 22 de outubro de 1969, nos Estados Unidos, enquanto que no Reino Unido, o álbum só foi lançado em 31 de outubro. 

Foto original que serviu de referência para capa de Led Zeppelin II, e que traz o legendário piloto
Manfred von Richthofen, o "Barão Vermelho", cabine do avião. 

Led Zeppelin II começa com o hard rock arrasa-quarteirão “Whole Lotta Love”, cuja letra foi inspirada em “You Need Love”, do bluesman norte-americano Willie Dixon (1915-1992), e gravada em 1962 por Muddy Waters (1913-1983). Para fazer os arranjos de “Whole Lotta Love”, o Led Zeppelin tomou como referência “You Need Loving”, uma canção dos Small Face, lançada em 1966. Até mesmo o fraseado do canto de Robert Plant em “Whole Lotta Love” é semelhante à de Steve Marriott (1947-1991), então vocalista dos Small Faces quando gravou “You Need Loving”. Curiosamente, os versos da música dos Small Faces foram descaradamente surrupiados de “You Need Love”, de Dixon, e creditados a Ronnie Lane (1946-1997) e Steve Marriott. Por incrível que pareça, os Small Faces nunca sofreram processo por isso, porém, o Led Zeppelin, não escapou: os membros da banda foram acionados judicialmente, acusados de plágio. O imbróglio foi resolvido com a inclusão do nome de Willie Dixon nos créditos de Whole Lotta Love”, junto aos nomes de Jimmy Page, Robert Plant, John Paul Jones e John Bonham (1948-1980).

Musicalmente, “Whole Lotta Love” é marcado não só pelo peso sonoro, mas também pela performance vocal de Robert Plant, que imprime um canto agressivo. No trecho psicodélico da música, Plant faz improvisações vocais com uma forte carga sexual que mais parece uma explosão orgásmica.

“What Is And What Should Never Be”, a faixa seguinte, alterna na sua primeira metade suavidade e peso, para na sua reta final descambar para o hard rock. Robert Plant teria escrito a letra da canção se referindo a um romance que ele teve com a irmã de sua esposa antes de casar-se com ela.

O Led Zeppelin foi acusado de plagiar os versos de "You Need Love" de
Willie Dixon (foto) para compor "Whole LottalLove".

O blues rock “The Lemon Song” foi inspirado em “Killing Floor”, de Howlin’ Wolf (1910-1976), música que o Led Zeppelin costumava tocar durante a turnê do primeiro disco. “The Lemon Song” foi mais um caso em que banda foi acusada de plágio. O Led Zeppelin foi processado pela Arc Music, editora onde as canções de Wolf foram registradas. Após um acordo entre as partes, Wolf recebeu um cheque de 45.123 dólares, e as reedições subsequentes de Led Zeppelin II, passaram a trazer nos créditos Chester Burnett - nome de batismo de Howlin’ Wolf - como coautor de “The Lemon Song”. Gravada praticamente ao vivo dentro do estúdio, “The Lemon Song” traz em seus versos uma conotação sexual inspirada em “Travelling Riverside Blues”, de Robert Johnson: “Squeeze me baby, 'till the juice runs down my leg / The way you squeeze my lemon, I'm gonna fall right out of bed” (“Me aperte baby, até o caldo começar a escorrer pela minha perna / O modo como você espreme meu limão, eu vou cair da cama”).

O lado A da versão LP de Led Zeppelin II se encerra com “Thank You”, uma linda balada folk rock. Foi através de “Thank You” que Jimmy Page percebeu que Robert Plant estava evoluindo como letrista e que estava capacitado para escrever a maioria das letras das músicas da banda. Plant escreveu “Thank You” dedicando-a à sua esposa, Maureen. A música possui uma delicada e agradável base instrumental em que se destaca o órgão Hammond C-3, executado por John Paul Jones, que além de baixista, mostra que é um tecladista competente. Próximo ao fim da faixa, o órgão cria um final falso, quando segundos depois, o som do órgão retorna rapidamente para encerrar em seguida a canção em definitivo.

Lado interno da capa dupla de Led Zeppelin II.

“Heartbreaker” abre o lado B do álbum com um riff de guitarra fantástico de Jimmy Page, imitado por gerações de guitarristas. O final deste blues rock é emendado com a próxima faixa, “Living Loving Maid (She’s Just A Woman)”, um hard rock curto e com forte apelo comercial: riffs de guitarra afiados, ritmo contagiante e refrão “grudento”. A letra trata de uma senhora de meia-idade, outrora da alta sociedade, que depois da decadência social, vive de pensão e circula com seu velho Cadillac tentando aproveitar os prazeres da vida que ainda lhe resta. Lançada como lado B do single de “Whole Lotta Love”, “Living Loving Maid (She’s Just Woman)” é uma das poucas músicas do Led Zeppelin em que Jimmy Page fez vocais de apoio.

“Ramble On” é um folk rock com uma letra inspirada na obra Senhos dos Anéis, de J.R.R. Tolkien (1892-1973), e faz referências a personagens da obra como Mordor e Gollum. Enquanto esteve na ativa, o Led Zeppelin nunca tocou essa música na íntegra nos seus shows, no máximo, e raramente, tocava uma parte dela de forma introdutória para emendar com outra música. Em 2007, “Ramble On” foi tocada na íntegra ao vivo pela primeira vez, quando houve uma reunião do Led Zeppelin, na Arena O2, em Londres.

Na sequência, mais uma faixa com referência literária, a instrumental “Moby Dick”, cujo título foi tomado emprestado do romance de mesmo nome, de autoria do escritor norte-americano Herman Melville (1819-1891). A faixa começa com baixo, guitarra e bateria juntos em ritmo de hard rock. No meio da música abre-se espaço para John Bonham fazer o seu solo de bateria incrível. Após o longo solo de bateria, a música termina com todos os instrumentos tocando juntos novamente.

O blues rock “Bring It On Home” fecha o álbum brilhantemente. A música começa num ritmo que remete aos blues antigos, com Robert Plant cantando como se estivesse com a voz abafada ao estilo dos velhos bluesmen norte-americanos. O solo de gaita foi executado pelo próprio Plant, gravado separadamente num estúdio em Vancouver, no Canadá. Após o blues de raiz introdutório, um hard rock furioso e pesado toma conta da faixa, até que mais à frente, sai de cena e dá espaço novamente ao blues rústico inicial que encerra a música.

Composta por Willie Dixon, em 1963 e gravada pela primeira vez por Sonny Boy Williamson II (1912-1965), “Bring It On Home” foi mais uma faixa do álbum que levou o Led Zeppelin à acusação de plágio. Jimmy Page e Robert Plant se defenderam dizendo que a intenção era fazer uma homenagem a Sonny Boy Williamson II na parte introdutória da música em que reproduz os versos de Dixon. O restante da letra da canção foi composto por eles. Contudo a ideia do tributo a Williamson II não convenceu e a dupla foi processada em 1972. Um acordo entre Page, Plant, e a Arc Music (editora onde a música de Dixon foi registrada) foi fechado, e o nome de Willie Dixon passou a ser incluído como coautor da música.

Sonny Boy Williamson II, bluesman que gravou "Bring It On Home", de Willie Dixon,
muito antes do Led Zeppelin.

A reação da crítica a Led Zeppelin II, a princípio, foi razoável. No Reino Unido, a revista Time Out afirmou que em seu segundo álbum, o Led Zeppelin se mostra mais solto do que no primeiro, enquanto que a revista Disc And Music Echo, destacou que embora fosse difícil registrar em disco a excitação que a banda provocava no palco, Led Zeppelin II chegava bem perto disso. Já nos Estados Unidos, o crítico musical John Mendelssohn, da revista Rolling Stone, que não fora tão receptivo ao primeiro álbum, mostrou-se irônico com o segundo ao dizer que ouviu o álbum “com um pouco de erva vietnamita pesada... mescalina, novocaína, um pouco de Romilar, e foi tão surpreendente quanto antes”, e depois arrematou: “Devo admitir que ainda não ouvi sóbrio, mas não acho que seja a melhor maneira de ouvir um grupo tão pesado”.

O público por sua vez, aguardou Led Zeppelin II com ansiedade, a tal ponto do álbum ter a vendagem antecipada chegando à casa das 400 mil cópias vendidas. A Atlantic Records fez uma caprichada campanha promocional para divulgar o álbum, e usou slogans como “Led Zeppelin - A única maneira de voar” e “Led Zeppelin II - Voando agora”. A contragosto do Led Zeppelin, a Atlantic Records lançou o single de “Whole Lotta Love” no mercado norte-americano, onde vendeu mais de 900 mil cópias. No entanto, a banda vetou o lançamento do single no Reino Unido, e divulgou uma nota justificando: “O Led Zeppelin não pretende lançar essa faixa como compacto, pois foi conceitualmente composta como parte de um conceito de álbum”.

Nos Estados Unidos, Led Zeppelin II fez uma disputada acirrada com Abbey Road, dos Beatles, destronando o álbum do quarteto de Liverpool do primeiro lugar por duas vezes, sendo assim o primeiro álbum do Led Zeppelin a conquistar o topo da parada de álbuns do mercado norte-americano, onde permaneceu nessa posição por sete semanas. Na Grã-Bretanha, Led Zeppelin II conquistou o primeiro lugar em fevereiro de 1970. Em seis meses de lançamento, o álbum vendeu em todo o mundo cinco milhões de cópias, 3 milhões somente nos Estados Unidos.

Ainda em 1970, o designer gráfico David Juniper foi indicado ao Grammy Awards para a categoria “Melhor Capa de Álbum”, pelo trabalho que fez para a capa de Led Zeppelin II. No mesmo ano, em outubro, o Led Zeppelin lançava o terceiro álbum, Led Zeppelin III, um trabalho onde a banda inglesa aliviou no peso, e deu mais ênfase à sonoridade eletroacústica do folk rock.

Ao longo das décadas, a reputação de Led Zeppelin II e a sua relevância para a história do rock só cresceram. Para uma parcela da crítica, o álbum se tornou um padrão de rock pesado que serviu de referência para bandas de hard rock e heavy metal que viriam a surgir após o seu lançamento como Aerosmith, Iron Maiden e Guns N’ Roses. Os solos de Jimmy Page em “Heartbreaker”, por exemplo, foram inspiração para os guitarristas Eddie Van Halen e Steve Vai. Em 2011, Led Zeppelin II foi classificado em 79º lugar da lista dos 500 Melhores Álbuns de Todos Os Tempos, da revista Rolling Stone. 

Faixas

Lado A

1 – “Whole Lotta Love” (Jimmy Page - Robert Plant - John Bonham - John Paul Jones - Willie Dixon)
2 – “What Is and What Should Never Be” (Page - Plant)
3 – “The Lemon Song” (Page - Plant – Jones - Bonham - Chester Burnett)
4 – “Thank You” (Page - Plant)

Lado B

5 – “Heartbreaker” (Page - Plant – Jones - Bonham)
6 – “Living Loving Maid (She's Just a Woman)” (Page - Plant)
7 – “Ramble On” (Page - Plant)
8 – “Moby Dick” (Bonham – Jones - Page)
9 – “Bring It On Home” (Page – Plant - Dixon)

Led Zeppelin: Robert Plant (vocal e gaita), Jimmy Page (guitarra, vocais de apoio e teremim em "Whole Lotta Love"), John Paul Jones (baixo, órgão e vocais de apoio) e John Bonham (bateria, percussão, tímpano e vocais de apoio).

Referências:
Classic Rock Monografie n.4 – Led Zeppelin -  2017 - Sprea Editori
Led Zeppelin : All the Albums, All the Songs - Martin Popoff, 2017, Voyageur Press
Led Zeppelin : Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra Mick Wall, 2017, Globo Livros
ledzeppelin.com
Wikipedia

"Whole Lotta Love" (videoclipe oficial)



"What Is And What Should Never Be"



"The Lemon Song"



"Thank You"



"Heartbreaker"


"Living Loving Maid (She's Just A Woman)"


"Ramble On"


"Moby Dick"


"Bring It On Home"







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