“O Samba Poconé” (Sony Music, 1996), Skank



Por Sidney Falcão

Segundo álbum do Skank, Calango pôs deu grande projeção à banda mineira em todo o Brasil e ajudou a abrir um novo momento para o rock brasileiro nos anos 1990, ao lado do primeiro e autointitulado álbum dos Raimundos e de Da Lama Ao Caos, álbum de estreia de Chico Science & Nação Zumbi, todos eles lançados em 1994. Calango fez um enorme sucesso comercial, vendeu mais de 1 milhão de cópias, conquistando assim o Disco de Diamante, e teve faixas como “Jackie Tequila”, “Esmola”, “Te Ver” e a regravação de “É Proibido Fumar”, antigo sucesso de Roberto Carlos, entre as músicas mais tocadas no Brasil na época. Após o estouro de Calango, o Skank se via desafiado em fazer do próximo álbum algo melhor ou superior.

Gravado no estúdio Mosh, em São Paulo, O Samba Poconé, o terceiro álbum de estúdio do quarteto, contou com a produção de Dudu Marote em parceria com próprio Skank. Insatisfeito com a mixagem de Calango, o Skank decidiu mixar O Samba Poconé  fora do Brasil, no Soundtrack Studios, em Nova York, sob responsabilidade de Michael Fossenkemper. Abanda passou duas semanas em Nova York mixando o novo álbum.

Para o novo álbum o Skank convidou o francês Manu Chao, vocalista da banda francesa Mano Negra, para participação especial em três faixas de O Samba Poconé. O Skank e o Manu Chao já se conheciam desde 1992, quando o francês esteve em Belo Horizonte, cidade natal do quarteto.

Manu Chao: participação especial em três faixas de O Samba Poconé.

O título teve como inspiração a cidade de Poconé, que se localiza no interior do Mato Grosso. Além disso, o conteúdo do disco buscou inspiração nos antigos filmes de comédia produzidos pela companhia cinematográfica Atlântida, estrelados por Zé Trindade, Renta Fronzi, Grande Otelo dentre outros. Os pequenos circos do interior do Brasil também foram outra fonte de inspiração para o álbum.

Todas es referências estão presentes na concepção da arte gráfica de O Samba Poconé. A banda contratou o ilustrador espanhol radicado no Brasil, José Robles, que entre os anos 1950 e 1970, ilustrou vários cartazes e painéis de cinemas de São Paulo. O design gráfico do encarte ficou por conta de Gringo Cardia.

O Samba Poconé chegou às lojas em 5 de julho de 1996, e já 500 mil cópias vendidas antecipadamente. Foi o primeiro álbum da banda mineira a receber um tratamento promocional para lançamento internacional. Em seu terceiro álbum, o Skank deu não só prosseguimento ao que musicalmente foi explorado em Calango, como reggae e o ragga, como também se aproximou da sonoridade do pop praticado nos país de língua hispânica.

Uma das ilustrações do encarte de O Samba Poconé, de autoria do ilustrador espanhol
radicado no Brasil, José Robles.

“É Uma Partida de Futebol” é quem abre o álbum grande estilo. Composta por Nando Reis e Samuel Rosa, é sem sombra de dúvidas, uma das melhoras e mais contagiantes músicas já feitas em língua portuguesa sobre o futebol. A letra descreve com grande emoção e propriedade, uma partida de futebol e a paixão que move tanta gente por esse que é o esporte mais popular do planeta.

A faixa seguinte, “Eu Disse A Ela”, é uma ragga de letra romântica, com uma batida eletrônica que contrasta com trombones. Samuel Rosa canta acompanhado de belos e afinados vocais femininos de apoio. Um dos versos faz referência à Avenida Contorno, em Belo Horizonte, cidade o Skank surgiu: “Ondas Amarelas na Contorno cheia...”.

“Zé Trindade” é uma faixa onde o Skank presta uma animada homenagem ao ator e comediante Zé Trindade (1915-1990). A música é um misto de pop latino, reggae e raggamuffin. Baiano de Salvador, Zé Trindade foi um astro do cinema brasileiro nas décadas de 1940 e 1950 em comédias fazendo papel de homem casado com mulher autoritária, mas que paquerava qualquer tipo de mulher que visse pela frente. Zé Trindade tinha um talento para criar bordões antológicos e mostravam o espírito dos tipos mulherengos que fazia no cinema: “Mulheres, cheguei!”, “Comigo é no jiló!” e “É chato a gente ser gostoso!”. O cantor francês Manu Chao faz participação especial nesta faixa.

O ator e comediante Zé Trindade, homenageado pelo Skank em uma música que leva o seu o nome.

A faixa do álbum que talvez rivalize em popularidade com “É Uma Partida de Futebol” é “Garota Nacional”. Com uma letra que trata sobre um sujeito que não resiste ao poder de sedução de uma garota, a música ganhou na época um videoclipe em que o Skank contou com a participação de belas atrizes e modelos como Carla Marins, Ingra Liberato, Vanessa de Oliveira, Paloma Duarte, Dominique Scudera, Cibele Larrama e Shirley Miranda. O videoclipe conquistou o prêmio do MTV Video Music Brasil, em 1996, na categoria “Escolha da Audiência”.

O ska pop “Tão Seu” traz um romantismo em seus versos e descreve os efeitos irresistíveis que um novo amor exerce sobre uma pessoa: “Eu faço tanta coisa / Pensando no momento de te ver / A minha casa sem você é triste / A espera arde sem me aquecer”. É uma das faixas mais famosas do álbum”.

Após um tema romântico, uma música com uma temática social, “Sem Terra”, faixa que inspirada no Movimento dos Sem Terra e a sua luta pela reforma agrária no Brasil. Manu Chao participa nos vocais nesta faixa. 

O título pode parecer se tratar de uma música sobre políticas, mas na verdade “Os Exilados” é um reggae romântico e que fala sobre a força que o amor, capaz de ultrapassar barriras e distâncias:  “Com você eu vou mais longe / Que os cristos, que as crenças / Que o bonde de Valença / Com você eu vou mais longe ê”.

A atriz Carla Marins em cena do videoclipe de "Garota Nacional".

 “Um Dia Qualquer” é talvez a faixa mais “miscigenada” do álbum, uma mistura de referências musicais. A faixa possui uma bateria e uma percussão bem presentes, uma linha de baixo robusta, e os trompetes bastante destacados. 

O Skank volta a fazer dueto com Manu Chao em “Los Pretos”, música com letra em espanhol que trata de racismo, mas que ao mesmo tempo, parece lançar uma luz no fim do túnel, um fio de esperança: “Toda esperanza a los pretos / Toda esperanza a nosotros / Los pretos de Manhattan, los pretos de los guetos / Los pretos de ojos en los astros”. (“Toda esperança para os pretos / Toda esperança para nós / Os pretos de Manhattan, os pretos dos guetos / Os negros dos olhos nas estrelas”).

Segue-se o reggae pop de “Sul da América”, e o álbum se encerra com “Poconé” e seu ritmo acelerado e animado que lembra uma mistura de ska e baião.

O Samba Poconé superou todas as expectativas, foi aclamado pelo público e pela crítica. As faixas “É uma Partida de Futebol”, “Garota Nacional”, “Tão Seu” foi bastante executada em rádio e contribuíram para que o álbum vendesse mais de 1,8 milhão de cópias, tornando-se o mais vendido da discografia do Skank.

Skank nos anos 1990. 

Além da turnê nacional, o Skank internacional que incluiu Argentina, Chile, Estados Unidos, Portugal, Espanha, Itália, Alemanha e Suíça. Na Espanha, “Garota Nacional” foi 1º lugar na parada radiofônica.

O rastro do sucesso do Skank atraiu outros olhares. Um poeta baiano chegou a processa a banda mineira por supostamente ter plagiado algumas de suas letras, mas acabou não dando em nada. Algumas gravadoras, com a intenção de ganhar mais dinheiro, lançaram bandas que eram meras cópias do som Skank, dentre elas, uma tal de Sr. Banana, de Curitiba.

Isso de alguma forma acabou influenciando o quarteto mineiro a iniciar um processo de reorientação musical, buscando não ficar preso numa “fórmula” e partir para uma outra sonoridade. A partir dos dois álbuns seguintes, Siderado (1998), e Maquinarama (2000), o Skank iniciou o seu caminho rumo a um som com texturas psicodélicas e com algumas referências de Britpop, cujo processo se consolidou no elogiado álbum Cosmotron (2003), quando a banda em nada mais lembrava aquela da fase O Samba Poconé.

Faixas
  1. "É Uma Partida de Futebol" (Nando Reis - Samuel Rosa)
  2. "Eu Disse a Ela"                 
  3. "Zé Trindade"                   
  4. "Garota Nacional"                          
  5. "Os Exilados"                    
  6. "Los Pretos"        
  7. "Tão Seu"             
  8. "Sem Terra" (Chico Amaral)
  9. "Um Dia Qualquer"          
  10. "Sul da América"               
  11. "Poconé" (Chico Amaral)


Todas as canções são de autoria de Samuel Rosa e Chico Amaral, exceto as indicadas.

Skank: Samuel Rosa (guitarra e voz), Henrique Portugal (teclado e vocal), Lelo Zaneti (baixo e vocal) e Haroldo Ferretti (bateria).


Ouça na íntegra o álbum O Samba Poconé



"É Uma Partida de Futebol"
 (videoclipe original)




"Garota Nacional" (videoclipe original)



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