“Lilás” (CBS, 1984), Djavan
Por Sidney Falcão
Na primeira metade dos anos 1980, Djavan consolidou sua presença na música popular brasileira em um período de intensas mudanças e novas possibilidades. A MPB vivia um processo de renovação, com artistas abraçando influências internacionais, como o pop e o soul, e incorporando elementos eletrônicos em suas criações. Com o Brasil em transição política rumo à redemocratização, os jovens buscavam uma música que fosse ao mesmo tempo moderna e alinhada com o cenário global. Djavan, então, estava em sintonia com essa atmosfera de transformação, trazendo uma MPB sofisticada e inovadora que dialogava com o público de sua geração.
Após o sucesso de Luz (1982), Djavan entrou para a galeria dos grandes compositores e intérpretes do Brasil, reconhecido por sua habilidade em fundir jazz, soul e música brasileira em uma assinatura única. Lilás, lançado em 1984, surgiu como um desdobramento natural desse estilo, mas com uma pegada ainda mais pop e acessível, sem perder a riqueza poética e rítmica que o tornava inconfundível. Nesse momento, Djavan continuava explorando novos horizontes, ampliando sua sonoridade e reafirmando sua posição de destaque em uma MPB cada vez mais plural e conectada ao mundo.
Assim como em Luz, Djavan e a gravadora optaram por gravar Lilás em Los Angeles, nos Estados Unidos. O material para o novo álbum foi registrado entre fevereiro e março de 1984, nos estúdios Sunset Sound, sob a produção de Erich Bulling, experiente produtor que ajudou Djavan a explorar os recursos eletrônicos para empregá-los em seu trabalho. Contudo, o cantor alagoano não abriu mão dos músicos de sua confiança que o acompanharam na gravação de Lilás em Los Angeles, como o pianista Luiz Avellar, o baixista Sizão Machado e o baterista Téo Lima, além de músicos brasileiros radicados nos Estados Unidos, como o maestro Oscar Castro Neves e o percussionista Paulinho da Costa, ambos amigos do cantor.
O uso de sintetizadores e baterias eletrônicas no álbum Lilás dialoga com os baixos encorpados e as camadas de teclado, criando uma atmosfera contemporânea e, ao mesmo tempo, delicada, em que cada instrumento encontra seu espaço sem competir. Tudo isso resulta em um som limpo e minuciosamente trabalhado, que favorece a clareza dos arranjos e valoriza a voz suave de Djavan.
Djavan conseguiu em Lilás uma fusão única de
elementos que, embora cosmopolita, permanece essencialmente brasileira. A
música negra americana, especialmente o jazz e o R&B, dialoga perfeitamente
com ritmos brasileiros, como o samba e o baião, que se fazem presentes de forma
sutil e refinada. Toda essa combinação, muito bem construída, é "envernizada"
pela sonoridade pop eletrônica empregada pelos sintetizadores.
Composto por nove faixas, o álbum Lilás começa com a levada pop dançante da faixa-título. A letra celebra a beleza dos ciclos naturais e o encantamento diante da cor lilás no pôr do sol, traduzindo a contemplação e a emoção que esse momento desperta. O refrão destaca o pôr do sol como um símbolo universal de beleza e conexão profunda com a natureza e as pessoas: “Eu quero ver o pôr do sol / Lindo como ele só / E gente pra ver, e viajar / No seu mar de raio”.
A faixa seguinte, “Infinito”, é um R&B dançante marcado por uma linha de baixo robusta e acentuada. Os versos de “Infinito” expressam a entrega e a contradição de um indivíduo estar preso ao amor, ao mesmo tempo que busca liberdade e plenitude nessa ligação intensa e envolvente: “Por falar no amor / Acho que vou buscar / Viver por você / Ou me acabar / Quem mandou me acorrentar”.
O ritmo do álbum diminui com a balada “Esquinas”, uma canção de andamento arrastado e arranjo minimalista. A letra aborda as experiências e os desafios únicos de cada indivíduo, destacando a superação de dificuldades pessoais e as pressões das relações humanas. Djavan reflete sobre o caminho singular que cada um percorre, marcado por lutas e aprendizados intransferíveis.
“Transe” possui um balanço funk, porém calmo, discreto e sofisticado. A letra explora a entrega apaixonada e a intensidade dos sentimentos que surgem em um estado de êxtase amoroso, onde tudo ao redor ganha um brilho especial e flui em harmonia com a emoção.
O lado 1 do álbum Lilás termina com “Obi”, um samba com acentuação jazzística que celebra as raízes africanas e a riqueza cultural brasileira. Djavan usa referências simbólicas e religiosas para explorar a identidade e a resistência cultural do povo brasileiro.
“Miragem” abre o lado 2 do álbum Lilás, uma canção sobre a intensidade e a efemeridade do amor, retratando-o como uma busca constante e idealizada que, por mais forte e real, é ilusória e passageira. “Íris” é uma canção que trata do encanto e do fascínio que o olhar de alguém provoca, revelando um amor arrebatador que ao mesmo tempo atrai, distrai e transforma o eu lírico. Inspirada na música nordestina, "Canto da Lira" expressa a força envolvente e quase hipnótica da música e da poesia, representando-as como um chamado profundo que liga o eu lírico a emoções intensas e transcendentes.
O álbum chega ao fim com “Liberdade”, uma balada recheada de camadas de teclados como pano de fundo sonoro. Através de seus versos, "Liberdade" retrata a busca do eu lírico por um amor transformador e pela liberdade, que transcendem barreiras físicas e espirituais, exigindo entrega e confiança para alcançar plenitude e uma conexão profunda.
Lilás foi mais um álbum bem-sucedido na discografia de Djavan. Com mais de 300 mil cópias vendidas, o álbum gerou quatro compactos (singles): “Lilás”, “Miragem”, “Esquinas” e “Infinito”. Uma de suas faixas, “Infinito”, foi escolhida para integrar a trilha sonora da novela Um Sonho a Mais, exibida pela TV Globo em 1985.
Após dois anos gravando em Los Angeles, Djavan voltou a
gravar no Rio de Janeiro em 1986, quando lançou seu sétimo disco, Meu
Lado, acompanhado pela banda de apoio Surucucu de Capote.
Faixas
Todas as
faixas são composição de Djavan.
Lado A
- "Lilás"
- "Infinito"
- "Esquinas"
- "Transe"
- "Obi"
Lado B
- "Miragem"
- "Íris"
- "Canto da Lira"
- "Liberdade"
Referências:
djavan.com.br
wimkipedia.org
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