“Téléphone” (Pathé-Marconi,1977), Téléphone


Por Sidney Falcão

Poucas bandas e artistas na história do rock francês desfrutaram de um prestígio gigantesco como a Téléphone. Durante dez anos, entre 1976 e 1986, a Téléphone foi a banda mais popular do rock francês, com dezenas de hits nas paradas radiofônicas, milhões de discos vendidos e sucessivas turnês pela França e exterior. As plateias estavam sempre lotadas e ávidas para verem de perto aquele quarteto praticando um rock energético, urgente, acessível, apoiado em riffs de guitarra arrasadores, uma linha de baixo segura, uma bateria demolidora e um vocalista completamente alucinado, como se tivesse acabado de levar um choque de altíssima voltagem. 

A trajetória meteórica da Téléphone começa em 1976, em Paris, quando Jean-Louis Aubert (vocais e guitarra) e Richard Kolinka (bateria), ambos ex-membros da banda Semolina, decidem formar uma nova banda de rock. Somaram-se a eles, dois ex-integrantes de uma outra banda, a Shakin Street, Louis Bertignac (guitarra e vocais) e Corine Marienneau (baixo). A nova banda, a princípio, foi batizada com o estranho nome “!”, mas sabiamente foi renomeada para Téléphone. 

Em novembro de 1976, a Téléphone fez as suas primeiras apresentações ao vivo, tocando canções dos Rolling Stones e The Who. Além dessas duas bandas, o som do quarteto parisiense era influenciado pela sonoridade anárquica do punk britânico que àquela altura, causava uma verdadeira revolução musical no Reino Unido.

Mas foi no ano seguinte que surgiram as primeiras grandes oportunidades a banda. Em março de 1977, a Téléphone foi a atração de abertura para o show de Eddie & The Hot Rods, no Pavillon Part, em Paris. Três meses depois, em junho, Téléphone abriu o show da banda americana Television, no Olympia, também em Paris, após desistência do Blondie. A apresentação da Téléphone repercutiu na imprensa e chamou a atenção da gravadora Pathé-Marconi, uma subsidiária francesa da EMI. O quarteto assinou um contrato com a companhia que previa a gravação de três álbuns. 

Para auxiliar na gravação do álbum de estreia da Téléphone, foi contratado Mike Thorne, um produtor inglês que já havia trabalhado em estúdio com algumas punks bandas inglesas, dentre as produções a então recém lançada compilação The Roxy London WC2, álbum gravado ao vivo e que trazia bandas punks britânicas como Buzzcocks, Sham 69, Slaughter & The Dogs, X-Ray Spex entre outras. Por sugestão de Thorne, as gravações do álbum de estreia da Téléphone ocorreram em Londres, no Reino Unido, no estúdio Eden. A Pathé-Marconi chegou a exigir que as canções fossem gravadas em inglês, mas o produtor achou melhor que fossem gravadas em francês. Todo o processo de mixagem foi feito no lendário estúdio Abbey Road, também em Londres, onde os Beatles gravaram os seus discos. 

Lançado em 25 de novembro de 1977, o álbum de estreia da Téléphone foi intitulado com o nome da banda. Em seu primeiro álbum, a Téléphone mostrou a que veio, trazendo uma sonoridade nova para o rock francês da época, totalmente sintonizada com o punk e a new wave que promoviam naquele momento um sopro de renovação no rock mundial. Ao mesmo tempo, era possível perceber no álbum outras referências como Rolling Stones, The Who e Chuck Berry (1926-2017). 

O álbum começa com “Anna” e seus riffs pesados e certeiros beirando o hard rock, abrindo uma sequência de rocks em alta temperatura. Embora comece num tom leve e delicado, “Sur La Route” segue numa crescente ganhando peso e velocidade sonora à medida em que a música avança, e cuja letra que fala de alguém que pedala sua bicicleta dia e noite seria uma metáfora sobre a busca de alcançar um objetivo, uma meta na vida. “Dans Ton Lit” possui riffs de guitarra contagiantes e um peso sonoro caótico que domina do meio para o fim da faixa. 

A bateria de Richard Kolinka dita o ritmo na abertura de ”Le Vaudou”, que traz o vocal berrado de Jean-Louis Aubert cantando sobre o mundo hostil que o ser humano encontra a partir do momento em que ele nasce, quando ele sai da segurança e aconchego do ventre da mãe. 

Banda francesa Téléphone, em sentido horário a partir da garota: Corine Marienneau,
Jean-Louis Aubert, Richard Kolinka e Louis Bertignac.

O ritmo frenético e pesado do disco é quebrado por um instante com a balada “Telephomme”, que encerra o lado 1 do álbum. A música surpreende a partir do metade da sua duração, quando a banda acelera o ritmo para um rock veloz e agressivo. A letra de “Telephomme” trata sobre desprezo, onde o eu lírico tem os seus telefonemas completamente ignorados pela mulher por quem é apaixonado. 

“Hygiaphone” abre o lado 2 do álbum Téléphone em ritmo de rock’n’roll com um riff de guitarra inspirado em Chuck Berry. Esta faixa foi um dos primeiros hits da banda francesa. O ritmo contagiante da faixa anterior prossegue com “Métro C’est Trop”, outra música presente no álbum que foi um grande sucesso da Téléphone, e que faz referência em seus versos sobre a vida frenética de quem faz uso diário do metrô. 

Em “Prends Ce Que Tu Veuse” as guitarras, a bateria e o baixo ditam o ritmo veloz da música e criam uma “parede sonora” compacta e pesada. Na letra, os versos tratam sobre aquele tipo de pessoa que numa amizade ou vida conjugal, se comporta como uma figura dominadora, tóxica, egoísta, arrogante, que tolhe a liberdade e o jeito de ser de quem está ao seu lado. 

Téléphone, o álbum, termina com “Flipper”, a faixa mais longa do disco. O ritmo é desacelerado, porém pesado, onde o quarteto francês consegue trafegar com competência entre o punk e o hard rock, com direito a uma guitarra bem ao estilo blues rock inglês pontuando toda a duração da faixa. O ouvinte é surpreendido com uma sessão percussiva que entra inesperadamente na metade da música. A letra de “Flipper” faz uma interessante relação entre a vida e o jogo de fliperama. 

Quando o álbum Téléphone foi lançado, equivocadamente Jean-Louis Aubert foi creditado como autor das músicas, o que fez com que só ele recebesse os direitos autorais, exceto a faixa “Flipper”, creditada a Louis Bertignac. A partir dos álbuns seguintes, os outros membros da banda foram creditados como autores das músicas.

O álbum Téléphone teve uma ótima recepção por parte do público em se tratando de um disco de estreia. Em poucas semanas de lançamento, o álbum vendeu 30 mil cópias. Em dez meses, o disco havia alcançado a marca de 100 mil cópias vendidas, levando a banda a conquistar o seu primeiro disco de ouro logo com o primeiro álbum. O álbum Téléphone gerou dois singles simples, “Anna”/”Hygiaphone” e “Métro (C'est Trop)”/“Prends Ce Que Tu Veux”, ambos os singles lançados em 1978. Vale destacar que pouco antes de ser contratada pela Pathé-Marconi, a Téléphone lançou um single de forma independente com as músicas “Hygiaphone” / “Métro (C'est Trop)”, gravadas ao vivo durante um show no Bus Palladium, em Paris, em 8 de junho 1977.

Com o sucesso comercial do seu álbum de estreia, a Téléphone tornou-se um fenômeno musical na França no final dos anos 1970, motivando um novo momento para o rock francês. As gravadoras passaram a investir no estilo, contratando bandas e cantores, o que fez abrir um novo mercado musical para o rock na França. 

A partir de então, a Téléphone, emendou uma turnê atrás da outra e uma sequência de lançamento de álbuns sempre com altos índices de venda, Crache Ton Venin (1979), Au Cœur De La Nusit (1980), Dure Limite (1982) e Un Autre Monde (1984). Como acontece com toda banda que alcança fama, dinheiro e super exposição midiática, a Téléphone vivenciou um desgaste entre seus integrantes, levando à dissolução da banda em 1986. 

Entre 2015 e 2017, os ex-integrantes da Téléphone chegaram a se unirem e a aturem juntos sob o nome Les Insus, mas sem a baixista Corine Marienneau. O power trio lançou em 2017 o álbum Les Insus Live, com registros gravados ao vivo no Accor Hotel Arena e no Le Trabendo, ambos em Paris. 

Faixas

Todos as canções foram escritas por Jean-Louis Aubert e compostos por Telephone, exceto “Flipper” , escrito por Louis Bertignac.

Lado 1
  1. “Anna”
  2. “Sur La Route”
  3. Dans Ton Lit”
  4. “Le Vaudou (Est Toujours Debout)”
  5. “Téléphomme”
Lado 2
  1. “Hygiaphone”
  2. “Métro (C'est Trop)”
  3. “Prends Ce Que Tu Veux”
  4. “Flipper”

Téléphone: Jean-Louis Aubert (vocais, guitarra base e guitarra solo), Louis Bertignac (guitarra solo e vocal de apoio), Corine Marienneau (baixo e vocal de apoio) e Richard Kolinka (bateria e percussão)

“Anna”

         “Sur La Route”
 
       "Dans Ton Lit”

“Le Vaudou (Est Toujours Debout)”

“Téléphomme”

        “Hygiaphone”

“Métro (C'est Trop)”

“Prends Ce Que Tu Veux”

“Flipper”

 “Hygiaphone” (videoclipe oficial)

“Métro (C'est Trop)” (videoclipe oficial)

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