“Sutis Diferenças” (EMI-Odeon, 1984), Vinicius Cantuária



Por Sidney Falcão

Vinícius Cantuária nasceu em 29 de abril de 1951, em Manaus, no estado do Amazonas. Aos sete anos de idade, ele e sua família se mudaram para o Rio de Janeiro. Em 1968, começou a sua carreira musical como baterista da banda de rock progressivo O Terço, na qual permaneceu até 1973. Durante toda a década de 1970, acompanhou vários artistas da música brasileira como Jorge Mautner, Luiz Melodia e Chico Buarque. Entre 1977 e 1983, integrou A Outra Banda da Terra, banda que acompanhava Caetano Veloso em shows e gravações.

Ao mesmo tempo que integrava como músico da banda de Caetano Veloso, Vinícius Cantuária começa a desenvolver o seu lado de compositor. Em 1981, Cantuária teve uma canção sua gravada por Caetano Veloso, “Lua e Estrela”, do álbum Outras Palavras, que se tornou um grande sucesso.

No ano seguinte, em 1982, em paralelo à carreira na Outra Banda da Terra, Cantuária assina contrato com a gravadora RCA, através da qual lança o seu primeiro e homônimo álbum solo, cuja faixa “Coisa Linda”, chegou a ter alguma repercussão. O segundo disco solo, Gávea de Manhã, é lançado em 1983.

Vinícius Cantuária (à direita) quando era membro da banda O Terço,
no começo dos anos 1970.

Em 1984, Caetano Veloso monta uma nova banda de apoio, com novos músicos, a Banda Nova. Coma dissolução de A Outra Banda da Terra, Cantuária passa a focar na sua carreira solo. Naquele mesmo ano, troca de gravadora, indo para a EMI-Odeon. De gravadora nova e focando na carreira solo, Vinícius Cantuária lança o seu terceiro disco solo, o Sutis Diferenças, um trabalho em que o cantor amazonense apresenta uma nova orientação musical.

Diferente dos dois álbuns anteriores de Cantuária, mais voltados para a MPB em que se percebe influências de Caetano Veloso, Chico Buarque e Milton Nascimento, Sutis Diferenças mostra o cantor seguindo para um outro caminho, indo em direção ao pop rock e a new wave. Isso é perceptível desde a concepção da capa à sonoridade do álbum. Provavelmente, o cenário musical brasileiro em meados dos anos 1980 em que o rock estava dominando, talvez tenha motivado Vinícius Cantuária a gravar um trabalho dentro dessa linha.

Sutis Diferenças é um álbum essencialmente pop. É um trabalho leve, acessível, radiofônico. Há um predomínio de sintetizadores e baterias eletrônicos na maioria da faixas, mas que convivem muito bem com os outros instrumentos convencionais, permitindo que o trabalho conserve uma organicidade sonora.

Produzido por Jorge Davidson, Sutis Diferenças conta com a participação especial de convidados ilustres como Flávio Venturini (na época, ainda membro do 14 Bis), o saxofonista Léo Gandelman, o guitarrista Marcelo Sussekind (integrante do Herva Doce naquele momento), Lulu Santos, Paulo Toller (vocal do Kid Abelha), os Paralamas do Sucesso, dentre outros convidados.

O álbum começa com “Sílvia”, um pop rock dançante que é uma parceria de Vinícius Cantuária e Chico Buarque, é sobre uma mulher fatal, que trata os seus amantes como um objeto sexual descartável. Destaque para a participação de Léo Gandelman nos solos de saxofone. Na balada pop romântica “Cheio de Amor”, Cantuária canta sobre entregar-se por completo ao amor, de “cabeça e coração”. Lulu Santos é o convidado na canção, fazendo uma participação especial bem discreta num solo de guitarra cheio de efeito.  

“Brilho da Cidade” trata sobre o universo noturno da cidade grande, e conta com os solos sensacionais de saxofone de Léo Gandelman, em cima de uma base rítmica dominada por percussão e bateria eletrônica programada. O romantismo volta a dar as caras em “Não É bem Assim”, um dueto de Cantuária e Chico Buarque, em que os dois cantam sobre as idas e vindas do amor.

Fechando o lado A, o pop melódico e agradável “Pro Outro Lado”, parceria de Vinícius Cantuária e Ronaldo Bastos. A letra versa sobre liberdade, do indivíduo não se prender a padrões convencionais e nem perder tempo com gente conservadora. A canção conta com os vocais de apoio femininos fazendo um “Uuuhhh,lá,lá,lá!” que remete a “You Won't See Me”, dos Beatles.

Detalhe da contracapa de Sutis Diferenças.

O lado B começa com a faixa mais famosa do álbum, “Só Você”, o maior sucesso da carreira solo de Vinícius Cantuária. “Só Você” é um exemplo de canção pop perfeita, sob medida para tocar no rádio, mas sem abrir mão da qualidade musical. A letra, de teor romântico, é sobre alguém que encontrou o amor de sua vida, e a ele expõe todo o seu sentimento das mais diversas maneiras. O ritmo da música é conduzido por uma bateria eletrônica programada, enquanto que o solo de guitarra no meio da faixa é executado por Marcelo Sussekind, do então Herva Doce. "Só Você" ganhou várias regravações, sendo a de Fagner a primeira, já em 1984. Depois "Só Você" foi regravada por gente como Tim Maia, Capital Inicial, Roberto Frejat entre outros ao longos dos anos. Mas a principal regravação e que alcançou uma grande sucesso foi a de Fábio Jr., em 1997.

“Esse Som Eu Quero” é um tributo de Cantuária aos Paralamas do Sucesso, uma homenagem bastante curiosa, levando-se em conta que é comum se render tributo a artistas veteranos. Os Paralamas estavam em início de carreira, com apenas dois álbuns no currículo e pouco mais de dois anos de carreira. A faixa conta com a participação de vários convidados participando do coro, como os próprios membros dos Paralamas, mais Paula Toller, o ator Hamilton Vaz Pereira e mais outros convidados. O tempo passou e mostrou que o tributo de Cantuária a uma banda iniciante não foi à toa: os Paralamas construíram uma carreira artística longeva e muito bem sucedida.

Uma das poucas músicas do álbum com uma inclinação maior para a MPB é “Sutis Diferenças”, faixa que dá nome ao álbum. Composta por Cantuária e Caetano Veloso, a canção afirma que na vida de casal, não importa as diferenças de visão mundo de cada lado, mas que elas se complementem: “Então nós dois sutis diferenças / Vamos combinar / Não há no amor quem vença ou não vença / Mas que luz vai dar”.

Os Paralamas do Sucesso em 1983, em início de carreira. No ano seguinte,
Vinícius Cantuária presta tributo à banda com "Esse Som Eu Quero". 

Se a vida é curta, o importante é ser feliz e mais nada, como prega a canção “Que Nada”, que conta com um naipe de metais formado por figuras estelares, dentre as quais Léo Gandelman e seu sax alto, o trombonista Serginho Trombone, o trompetista Márcio Montarroyos entre outros.

O álbum encerra com “No Dia Em Que Eu Vim Me Embora”, canção de Caetano Veloso gravada pelo mesmo em seu primeiro álbum, em 1968. A versão de Cantuária é mais intimista que a original. Ele canta e toca violão, e é acompanhado pelos teclados de Flávio Venturini. Embora a canção trate sobre um jovem que deixa a cidade natal no interior para tentar uma nova vida na cidade grande, a versão de Vinícius Cantuária ganhou um arranjo musical mais urbano, diferente da versão original de Caetano.

Sem sombra de dúvidas, a faixa do álbum mais executada foi “Só Você”. A música esteve nos primeiros lugares das paradas de rádio de todo o Brasil. Cantuária virou uma figura frequente nos programas de TV, merecendo até um videoclipe de “Só Você” no programa Fantástico da TV Globo. Outras faixas também fizeram tiveram boa execução em rádio como “Cheio de Amor”, “Sílvia” e “Esse Som Eu Quero”.

Os dois álbuns seguintes de Vinícius Cantuária, Siga-me (1985) e Nu Brasil (1991), prosseguiram na linha pop rock adota em Sutis Diferenças. Depois disso, Cantuária deu um tempo na carreira solo, chegando a acompanhar Chico Buarque na turnê do álbum Francisco, de 1987.

Após cinco anos, Vinícius Cantuária lançou um novo álbum solo, Rio Negro. Em 1993, Cantuária e mais outros nomes consagrados do pop rock brasileiro como Ritchie, Cláudio Zoli, Billy Forghieri (ex-Blitz), Dadi Carvalho e Mú Carvalho (os dois últimos da A Cor do Som), formaram o supergrupo Tigres de Bengala, que lançam o primeiro e único álbum que leva o nome da banda.

Um ano depois, Vinícius Cantuária toma uma atitude que vai mudar a sua vida e a sua carreira artística: decide mudar-se para os Estados Unidos. Desde então, sua a vida é toda concentrada naquele país, e sua música passou a ser mais voltada à MPB e ao jazz. Gravou discos com músicos americanos e fez turnês internacionais.

Faixas

Lado A 

  1. “Silvia” (Vinícius Cantuária – Chico Buarque)
  2. “Cheio De Amor” (Vinícius Cantuária)
  3. “Brilho Da Cidade” (Vinícius Cantuária – Mimi Lessa – Hamilton Vaz Pereira)
  4. “Não É Bem Assim” (Vinícius Cantuária)
  5. “Por Outro Lado” (Vinícius Cantuária – Ronaldo Bastos)

Lado B 

  1. “Só Você” (Vinícius Cantuária)
  2. “Esse Som Eu Quero” (Vinícius Cantuária)
  3. “Sutis Diferenças” (Vinícius Cantuária – Caetano Veloso)
  4. “Que Nada” (Vinícius Cantuária)
  5. “No Dia Em Que Eu Vim Me Embora” (Gilberto Gil – Caetano Veloso)

"Sílvia"

"Cheio de Amor"

"Brilho da Cidade"

"Não É Bem Assim"

"Por Outro Lado"

"Só Você"

"Esse Som Eu Quero"

"Sutis Diferenças"

"Que Nada"

"No Dia Que Eu Vim Me Embora"

"Só Você" 
(videoclipe original, na íntegra,
"Fantástico", TV Globo, 1984)






















Comentários

  1. review incrível. acho muito bacana essa onda new wave que teve aqui no Brasil com sintetizadores e tal mas sempre tenho dificuldade em encontrar albuns nesse estilo e daqui. muito obrigado

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    1. Muito obrigado pelo seu comentário, Pseudodark. Sobre a dificuldade em relação aos discos de new wave, depende do álbum, do artista, onde você está procurando e também se é para comprar ou apenas ouvir. Acho até que hoje é mais fácil, pelo menos, de ouvir os álbuns por causa da internet.

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