“Roberto Carlos Em Ritmo De Aventura” (CBS, 1967), Roberto Carlos


O ano de 1967 foi mais do que movimentado para o “Rei” Roberto Carlos. Ele estava no auge da popularidade como astro do Jovem Guarda, programa que comandava ao lado de Erasmo Carlos e Wanderléa na TV Record nas tardes de domingo, vendia milhões de discos e emplacava fileiras intermináveis de hits, e firmava-se como o maior ídolo da juventude brasileira. Mas naquele ano, além dos shows e do programa de TV, Roberto iniciava um novo desafio: a carreira cinematográfica.

Entre setembro e novembro de 1967, sob a direção de Roberto Farias, foi rodado o filme Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura, longa metragem protagonizado por Roberto Carlos e inspirado em Help!, dos Beatles, dirigido por Richard Lester. Com cenas rodadas no Rio de Janeiro, São Paulo e Nova York, o filme tem muita ação, aventura e certa ingenuidade. No filme, Roberto tenta fugir de sequestradores estrangeiros. 

E para enfrentá-los, Roberto briga, dirige carrões, tanque de guerra, lança granada “imaginária” e até viaja no espaço sideral. Algumas cenas foram filmadas no Cabo Kennedy, nas instalações da NASA, nos Estados Unidos. Em algumas cenas de ação, Roberto dispensou dublês. Uma das cenas antológicas do filme é a de Roberto pilotando um helicóptero que passa por dentro do Túnel do Pasmado, no Rio de Janeiro. Na verdade, nessa antológica e perigosíssima cena, o aparelho foi guiado por um piloto profissional. Todas as cenas foram alternadas por números musicais num ritmo de vídeo clipe, o que fez o filme ser uma obra pop por excelência.

Roberto Carlos fugindo dos bandidos internacionais no filme
em cena rodada no Corcovado, Rio de Janeiro. 

E esses números musicais do filme tiveram como base o álbum que dá nome ao filme e que serviu de trilha sonora. Sob a produção de Evandro Ribeiro, o álbum Roberto Carlos em Ritmo de Aventura foi gravado entre agosto e outubro de 1967. Quando o filme começou a ser rodado, o álbum já estaria em processo de finalização, o que facilitou nas gravações das cenas musicais do longa metragem.

Para a gravação do álbum, Roberto Carlos foi acompanhado por duas bandas, a sua, a RC-7, e a Renato & Seus Blue Caps, esta última já consagrada como uma das mais importantes da Jovem Guarda. Além de gravar seus próprios discos, Renato & Seus Blue Caps era uma banda que costumava tocar na gravação dos discos de boa parte dos ídolos da Jovem Guarda. Outra presença na gravação do álbum foi a do tecladista Lafayette, acompanhado do órgão Hammond. Das doze faixas de Roberto Carlos em Ritmo de Aventura, cinco eram de Roberto, seis eram de outros autores, e apenas uma era da dupla Roberto-Erasmo.

Cena espetacular do helicóptero passando por um túnel.

Apesar de contar com o apoio de duas bandas de rock nas sessões de gravação, Roberto decide fazer algo diferente no seu novo trabalho. Inspirado nos álbuns Rubber Soul e Revolver, dos Beatles, ou mesmo Pet Sounds, dos Beach Boys, que já experimentavam como o pop barroco e as orquestrações, Roberto decide incluir no seu novo álbum quarteto de cordas, violão de doze cordas, metais, cravo e flauta. Para tanto, Roberto recorre aos músicos veteranos da orquestra e metais da gravadora CBS que com o advento do rock’n’roll, vinham perdendo espaço nas gravações em disco para os instrumentos modernos como guitarras, baixos elétricos, teclados e baterias.

RC-7, banda de acompanhamento de Roberto Carlos.
Vale destacar que para este novo álbum, Roberto havia ampliado a sua banda, outrora RC-4, de quatro músicos para sete com a inclusão de uma sessão de metais formada por três músicos: Raul de Souza (trombone), Ernesto Neto (saxofone) e Magno D’Alcântara Pereira (trompete). Isso fez a banda ser renomeada de RC-4 para RC-7.

Até pouco antes da gravação do álbum, Roberto Carlos e Erasmo Carlos haviam rompido amizade após um desentendimento. Apareciam juntos apresentando o programa Jovem Guarda por causa dos compromissos contratuais, fora dali não estavam se falando. Para o seu novo álbum, Roberto assinou sozinho cinco faixas. Mas havia uma sexta que ele não conseguia terminar, pois estava sem tempo por causa dos shows, das gravações do disco e do filme. Sem conseguir finalizar a música, acabou tendo que recorrer à ajuda do velho parceiro com o qual estava rompido. Erasmo acabou ajudando Roberto terminar a música, e a amizade entre os dois retornou.

A música que Erasmo ajudou Roberto a terminar foi “Eu Sou Terrível”, e foi a última do álbum a ser gravada, mas é a primeira a abrir o álbum.  E valeu a pena, é um dos rocks mais marcantes já gravados por Roberto. A faixa é contagiante, traz um incrível solo de gaita e um marcante naipe de metais. Em seguida vem “Como É Grande O Meu Amor Por Você”, canção composta por Roberto na qual ele é acompanhado por flauta e violão. A canção se tornaria um dos maiores sucessos da carreira do astro da Jovem Guarda. Também composta apenas por Roberto, “Por Isso Corro Demais” começa com o ruído de carro a toda velocidade e que se repete durante toda a faixa. Nesse rock balada, Roberto corre com seu carro possante e veloz para rever a sua garota. O solo de órgão Hammond, executado por  Lafayette, contrasta com os ruídos de pneus do carro.

Lafayette: o mais requisitado tecladista da
Jovem Guarda.
Em “Você Deixou Alguém A Esperar”, de Édson Ribeiro e Helena Santos, Roberto pede para que sua amada esqueça que a fez chorar e pede para voltar. Ter tanto amor longe de quem se ama é o que Roberto questiona no rock “De Que Vale Tudo Isso”, outra música composta apenas por ele que traz mais uma vez Lafayette pilotando brilhantemente o seu órgão Hammond. A romântica, “açucarada” e singela “Folhas De Outono” fecha o lado A do álbum.

“Quando” abre o lado B e é mais um rock de Roberto com letra dotada de romantismo. Possui uma levada rítmica inspirada em “Taxman”, do Beatles. Lafayette faz um dos mais memoráveis solos de órgão de Hammond da Jovem Guarda. O trio de metais da RC-7 tem uma participação importante em “Quando”, fazendo uma espécie de “chamada e resposta”, ora em alguns versos que Roberto canta, ora com os solos de órgão de Lafayette. A faixa seguinte, a doce e ingênua “É Tempo De Amar”, é sobre o fim de um romance, onde o “Rei” consola uma garota que chora por um amor que acabou.

Renato & Seu Blue Caps gravaram a base
instrumental de algumas faixas; destaque para 
os irmãos Barros: o baixista Paulo César (centro
 de cima)  e o vocalista guitarrista 
Renato (abaixo à esquerda).
“Você Não Serve Pra Mim” é um rock de letra raivosa, um desabafo, onde Roberto põe fim a um relacionamento. Esta faixa foi composta por Renato Barros, vocal e guitarrista da banda Renato & Seus Blue Caps. Essa banda é quem acompanha Roberto em “Você Não Serve Pra Mim”, um dos melhores rocks gravados pelo líder da Jovem Guarda. Renato Barros faz uso de pedal fuzz na guitarra, que emprega distorção e um som “sujo” ao instrumento, dando assim um tom de agressividade à música que casa muito bem com canto cheio de raiva, mágoa e desprezo de Roberto. Além de Renato, merecem destaque em “Você Não Serve Pra Mim” o tecladista Lafayette, que faz um belo pano de fundo com o órgão Hammond que remete ao órgão dos Doors, e ao baixo pulsante de Paulo César Barros, irmão de Renato e integrante da Renato & Seus Blue Caps. 

A fúria de “Você Não Serve Pra Mim” é sucedida pela delicadeza de “É Por Isso Estou Aqui”. Nesta canção, Roberto demonstra que estava em sintonia com o pop barroco, tendência que estava em voga no rock internacional entre 1966 e 1968, quando a música pop flertava com a música erudita, adotando o emprego de quarteto de cordas e cravo. É nesta faixa que a experiência dos músicos veteranos da orquestra de cordas e metais da CBS teve um papel importante, dando à canção o tom barroco que Roberto queria. Além das cordas, há também o som que seria o de um cravo.

Cartaz do filme Roberto Carlos
 Em Ritmo de Aventura
.
Se o romantismo e a “dor de cotovelo” dão o tom temático em todo o álbum, o humor de “O Sósia” destoa de todo o resto de Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura. A faixa conta a história de um sujeito que se fazia passar por Roberto Carlos por ser parecido com o ídolo, mas que no final é desmascarado quando a farsa é revelada. Fechando o álbum, o rock balada “açucarado”, “Só Vou Gostar De Quem Gostar De Mim”.

Sétimo álbum da carreira de Roberto, Roberto Carlos em Ritmo de Aventura foi lançado em novembro de 1967. Já o filme homônimo estreou nos cinemas em fevereiro de 1968, e teve um público estimado em mais de 2,5 milhões de espectadores. Quase todas as faixas do álbum se tornaram sucessos instantâneos e duradouros na carreira de Roberto como "Eu Sou Terrível", "Como É Grande o Meu Amor por Você", "Por Isso Corro Demais", "Quando" e "Você Não Serve Pra Mim".

Roberto Carlos em Ritmo de Aventura marca um momento de transição na carreira do astro da Jovem Guarda, quando este começaria a se inclinar para a soul music, influenciado pelo som da Motown, ainda que discretamente. Mas tal inclinação se tornaria mais evidente a partir do álbum seguinte, O Inimitável, de 1968.

Faixas:

Lado A
  1. "Eu Sou Terrível" (Roberto Carlos - Erasmo Carlos)
  2. "Como É Grande O Meu Amor Por Você"
  3. "Por Isso Corro Demais"
  4. "Você Deixou Alguém A Esperar" (Édson Ribeiro)
  5. "De Que Vale Tudo Isso"
  6. "Folhas De Outono" (Francisco Lara - Jovenil Santos) 


Lado B 
  1. "Quando"
  2. "É Tempo De Amar" (Pedro Camargo - José Ari)
  3. "Você Não Serve Pra Mim" (Renato Barros)
  4. "E Por Isso Estou Aqui"
  5. "O Sósia" (Getúlio Côrtes)
  6. "Só Vou Gostar De Quem Gosta De Mim" (Rossini Pinto)


Todas as faixas são de autoria de Roberto Carlos, exceto as indicadas.




Ouça na íntegra o álbum Roberto Carlos em 
Ritmo de Aventura



"Eu sou Terrível"



"Por Isso Corro Demais"



"Quando"



"Você Não Serve Pra Mim"








Comentários