“Sobre Todas As Forças”(Epic, 1994), Cidade Negra
O reggae aportou em terras brasileiras nos anos 1970 e foi
muito bem assimilado. Vários artistas da MPB, do rock e do pop como Gilberto
Gil, Paralamas do Sucesso, A Cor do Som, Baby Consuelo e até mesmo Chico
Buarque, gravaram músicas inspiradas no ritmo jamaicano. Porém, o reggae
brasileiro, até os anos 1990, ainda não tinha revelado um grande astro
totalmente seu. As bandas e cantores genuinamente do reggae nacional, ainda
estavam relegados ao “gueto” da cena musical brasileira. Os artistas de outros
gêneros emplacavam um hit de reggae, mas um “regueiro” propriamente dito, não
conseguia. Irônico não?
A coisa só mudou em 1990, quando em meio à ressaca da
“geração 80” do rock brasileiro, a ascensão sertaneja e o modismo da lambada, a
banda carioca Cidade Negra lançava o seu primeiro álbum, o Lute Para Viver. Pela
primeira vez, uma banda de reggae brasileira ganhava popularidade no mainstream
do pop nacional, tocando no rádio e na TV. O álbum de estreia do Cidade Negra
foi puxado pelo hit "Falar A Verdade" que teve um boa execução
radiofônica e o clipe bem veiculado na TV. No álbum, a banda carioca ainda
contou com a participação especial de Jimmy Cliff na faixa “Mensagem”. Nesse
primeiro trabalho, o Cidade Negra já mostrava o seu posicionamento politizado
nas letras e que seria o fio condutor de toda a sua discografia.
Cidade Negra ainda com Rás Bernardo (á direita) |
Em 1992, o Cidade Negra lançou o segundo trabalho, Negro
No Poder. Mas ao contrário do primeiro álbum, o bom êxito não
se repetiu no segundo trabalho. O disco foi um tremendo fracasso comercial.
Houve um certo clima hostil entre a banda e as rádios e gente da imprensa
musical, a tal ponto do álbum ter sofrido boicote de algumas emissoras. Com o péssimo desempenho comercial de Negro No Poder, a permanência do
Cidade Negra na Sony Music ficou por um fio. Nessa situação complicada, o
vocalista Rás Bernardo acabou deixando a banda e foi substituído por Toni
Garrido, cantor que atuava na Banda Bel e com a qual havia gravado um disco, o Rei
do Rio (1992), de onde saiu o único hit do grupo, “Romário”, uma homenagem
ao “baixinho”, então craque da seleção brasileira de futebol.
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Toni Garrido quando era vocal da Banda Bel |
Antes de entrar no Cidade Negra, eu já o tinha visto antes
disso no comando da Bel no “Programa Livre”, do Serginho Groisman, no SBT, lá
por volta de 1993. Fiquei impressionado com o mix de soul, funk e pop da banda
tendo um negro nos vocais, coisa que no Brasil na época, pouco se via na TV
bandas pop assim. Com a saída de Rás Bernardo dos vocais, Toni levou pro Cidade
a levada pop e soul que fazia na Bel. Quem saiu ganhando foi o Cidade que além
de ter “temperado” mais o seu reggae ao agregar algumas doses de pop e soul, ainda ganhou um vocalista carismático com postura de “sex symbol, atraindo a
atenção do público feminino.
Com o novo vocalista, o Cidade Negra lançou em meados de
1994, o seu terceiro álbum, Sobre Todas As Forças, agora sob a
produção de Liminha. A banda buscava reverter o desempenho ruim do álbum
anterior e salvar o seu futuro na gravadora. A primeira música de trabalho do
álbum foi "Onde Você Mora?", um verdadeiro presente dado por Marisa
Monte e Nando Reis. O reggae romântico se tornou um grande sucesso, foi uma das
músicas mais executadas no país em 1994. A sorte voltava a sorrir para o Cidade
Negra, a canção tirou a “corda” do pescoço do quarteto de Belford Roxo.
E a coisa não parou por aí. No rastro de "Onde Você
Mora?" outras faixas de Sobre Todas As Forças viraram hits. "Pensamento",
“A Sombra da Maldade" e
"Querem Meu Sangue" (uma versão em português de Jimmy Cliff e
que já havia sido gravada pelos Titãs nos anos 1980) ganharam as rádios e as
TV’s. O álbum trouxe surpresas como as participações especiais do rapper
Gabriel, O Pensador em “Mucama” e de Shabba Ranks em "Downtown". Rapidamente,
o álbum alcançou a marca de 150 mil
cópias com poucos meses de lançamento. Em um ano já havia vendido mais de 800
mil cópias, algo jamais imaginado para um artista de reggae nacional até então.
Com Sobre Todas As Forças, o Cidade
Negra conquistou o estrelato e alcançou uma popularidade que jamais outro
artista de reggae brasileiro conseguiu. O sucesso do disco fez a banda carioca
se apresentar no começo de 1995 no Sumfest, importante festival de reggae da
Jamaica, ao lado de artistas consagrados como Inner Circle, Steel Pulse e Toots
& Maytals.
Acho Sobre Todas As Forças um discaço.
Nele, o Cidade conseguiu manter o reggae de raiz, mas ao mesmo tempo, sintonizou-se
com a reggae contemporâneo produzido lá fora na época e imprimiu nele um apelo
pop, muito por conta da bagagem musical trazida por Toni Garrido da sua antiga
banda, mas sem abrir mão dos temas sociais, presentes desde o primeiro álbum. Com
Sobre
Todas As Forças, o Cidade Negra ajudou a popularizar ainda mais o
reggae no Brasil e passou a figurar como um dos principais nomes da música pop
brasileira.
Por volta de 2000, numa enquete entre os leitores e
jornalistas da revista “Bizz” para um balanço dos melhores da década que
findava, Sobre Todas As Forças foi considerado o melhor disco de reggae
brasileiro dos anos 1990.
Faixas:
Lado A
- "Mucama" (Bino Farias - Da Gama – Lazão - Toni Garrido)
- "Querem Meu Sangue" (Jimmy Cliff - Versão: Nando Reis)
- "Downtown" (Bino Farias - Da Gama – Lazão - Ras Bernardo - Toni Garrido)
- "Luta de Classes" (Chico Amaral - Samuel Rosa)
- "Minha Irmã" (Da Gama - Charles Marsilla - Toni Garrido)
Lado B
- "Doutor"(Bino Farias - Da Gama - Lazão - Toni Garrido)
- "Onde Você Mora?"(Marisa Monte - Nando Reis)
- "A Sombra da Maldade"(Da Gama - Toni Garrido)
- "Casa" (Bino Farias - Da Gama - Lazão - Toni Garrido)
- "Pensamento" (Bino Farias - Da Gama – Lazão - Ras Bernardo)
"Onde Você Mora?"
"A Sombra da Maldade"
"Pensamento"
"Querem Meu Sangue"
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