“Luz” (CBS, 1982), Djavan


Entre o final dos anos 1970 e começo dos anos 1980, Djavan era um jovem astro da MPB ­em ascensão com quatro álbuns na sua discografia e sucessos tocando no rádio e na TV. O alagoano revelava-se não só um grande cantor, mas também um compositor talentosíssimo, dono de uma linha poética bastante rebuscada e refinada nas canções. Não foi à toa que isso acabou chamando a atenção de artistas consagrados como Maria Bethânia, Nana Caymmi, Roberto Carlos e Elis Regina que gravaram as suas canções naquele momento.

Após a sua passagem pela Som Livre onde gravou o seu primeiro disco em 1976, Djavan iniciou uma fase promissora na gravadora EMI-Odeon, a partir do segundo álbum, que leva o seu nome, lançado em 1979. Além do segundo, lançou mais dois álbuns, Alumbramento (1980), do megassucesso “Meu Bem Querer”, e Seduzir (1981), álbum que emplacou a faixa título e “Faltando Um Pedaço”.

O ano de 1981 foi bastante positivo para Djavan. A partir do álbum Seduzir, o cantor passou a ter a sua própria banda de apoio, a Sururu de Capote. Naquele ano ele conquistou o prêmio de “Melhor Compositor”, pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA), graças ao êxito comercial de Seduzir, um álbum no qual Djavan se mostra influenciado pelo pop, R&B e o jazz, influências e que nortearão os seus próximos trabalhos.

 Aquele momento promissor de Djavan na gravadora EMI-Odeon despertou a atenção da concorrente CBS (atual Sony Music), que passava por uma reformulação para superar uma crise, e precisava dar uma “oxigenada” no seu cast. Ela via no cantor alagoano uma boa aposta, e a ele fez uma proposta irrecusável. Tinha planos para ele, dentre os quais, uma carreira internacional. Apesar dos laços fortes com a EMI-Odeon, Djavan aceitou a proposta da CBS. Pouco depois de assinar contrato coma a CBS, Djavan e sua banda viajaram para Los Angeles, nos Estados Unidos para gravar o seu quarto álbum, o primeiro pela CBS, Luz. A gravadora apostou todas as fichas em Djavan, bancando todo o custo da produção do álbum.

O norte-americano Ronnie Foster, renomado produtor de discos no campo da soul music e do R&B, ficou a cargo da produção do álbum. Apesar de ter levado a sua banda, Djavan contou também com a participação de músicos norte-americanos na gravação do novo álbum, entre eles o baixista mexicano radicado nos Estados Unidos, Abraham Laboriel, que já havia colaborado em álbuns de várias estrelas da música como George Benson, Al Jarreau, Henry Mancini e Stan Getz. Mas a grande participação no álbum de Djavan foi nada mais nada menos do que a de Stevie Wonder. Djavan e Wonder se conheceram durante as gravações do álbum do brasileiro em Los Angeles. Wonder estava lá nas sessões de gravação para uma participação na faixa “Samurai” fazendo solos de gaita.

Stevie Wonder e Djavan nas sessões de gravação do álbum Luz, em Los Angeles, Estados Unidos, em 1982.

Lançado em agosto de 1982, Luz começa com a ótima balada romântica “Pétala”, cujos versos são uma bela declaração de amor. Os solos de saxofone realçam o espírito romântico da canção, uma das mais bonitas que Djavan já compôs. “Luz”, música que dá nome ao álbum, é a faixa seguinte, onde Djavan faz uma associação dos sentimentos humanos coma a natureza. “Nobreza” é uma canção que trata de uma amizade entre dois homens, mas que sutilmente, sugere um relacionamento homossexual: “Um doce descascado pra mim / Eu guardo pro fim / Pra comer demorado / Uma grande amizade é assim / Dois homens apaixonados”. Em “Capim”, Djavan faz uma associação entre a flora e as lendas do folclore brasileiro, e toma emprestado um verso de um antigo sucesso de Jackson do Pandeiro, “O Canto da Ema”: “A ema gemeu no tronco do Juremá”.

O ijexá pop “Sina” encerra o lado A de Luz. Mostra Djavan e sua capacidade de criar versos ricos em sentidos metafóricos. A música ainda traz uma homenagem a Caetano Veloso, transformado num verbo: “Como querer Caetanear / O que há de bom”. Curiosamente, no mesmo ano que Djavan lançou Luz, Caetano Veloso lançou o álbum Cores, Nomes onde ele gravou “Sina”. Na sua versão de “Sina”, Caetano teve Djavan como convidado, e o trecho “caetanear” foi trocado por “djvanear”.

“Samurai” é uma das grandes faixas do álbum, tendo a presença mais do que especial de Stevie Wonder nos solos de gaita. A música é uma das melhores demonstrações da veia pop de Djavan. Com um belo arranjo de cordas e um violão “Banho de Rio” fala de solidão e de um amor que foi embora.

Fantasia: álbum que traz a primeira versão de "Açaí".
“Açaí” foi gravada antes por Gal Costa, em 1981 para o seu álbum Fantasia, e aparece em Luz na versão do seu criador. Foi através de “Açai” que Djavan ganhou a fama de escrever canções com “letras sem sentido”, dado ao elevado emprego de metáforas que o cantor alagoano costuma empregar em suas canções. Durante muitos anos, o refrão “Açaí, guardiã / Zum de besouro um ímã / Branca é a tez da manhã” chegou a virar motivo de piada para uma parcela do público que não conseguia entender o significado dos versos.  Mais tarde, Djavan afirmou que o refrão da canção faz uma alusão à cultura da região norte do Brasil, onde o fruto açaí é muito consumido.

A balada romântica em tom jazzístico “Esfinge”, é outra canção do álbum também carregada de significados metafóricos na letra. Os primeiros versos da canção parecem descrever um quadro surrealista de Salvador Dali: “O mar / Vazou de uma paixão / Atravessou meus olhos / Encheu a minha mão / Caiu no chão / Em doces gotas de amor”.

“Minha Irmã” é um samba estilizado que fecha o álbum. Com versos curtíssimos, a música leva a crer que Djavan a compôs remetendo aos seus tempos de infância em Alagoas, lembrando da irmã mais velha Djanira: “Mãe disse que eu botasse o olho em você / Então, passa pra dentro, menino vai chover”. É bem aquela típica bronca de irmã mais velha para irmão mais novo mandando passar para dentro de casa.

Luz teve uma grande recepção da crítica e do público. O álbum foi lançado não só no Brasil como também nos Estados Unidos, Portugal, Espanha, Itália e França. “Samurai”, Pétala” e “Sina” foram bastante executadas no rádio e na TV, fazendo o álbum vender cerca de 450 mil cópias. O excelente êxito comercial de Luz marcou a estreia em grande estilo de Djavan na CBS. Logo ele se transformaria num dos campeões em vendas de discos na gravadora e numa das maiores estrelas da MPB.

Uma curiosidade no álbum Luz é que nas versões em CD as faixas “Pétala” e “Samurai” trocaram de lugar: “Samurai” passou a ser a primeira faixa e “Pétala” a sexta.

Faixas

 Lado A           
  1. "Pétala "        
  2. "Luz"
  3. "Nobreza"      
  4. "Capim"         
  5. "Sina"             

Lado B            
  1. "Samurai " ( participação especial de Stevie Wonder na gaita )   
  2. "Banho de Rio"          
  3. "Açaí"             
  4. "Esfinge"        
  5. "Minha Irmã"        

Todas as faixas são de autoria de Djavan.


Ouça o álbum Luz na íntegra.

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